RECONHECIMENTO

Outorga post mortem fez parte da programação dedicada ao Novembro Negro dentro da Semana Universitária 2025

Melina de Lima, neta de Lélia Gonzalez, recebeu a homenagem em nome da avó. Foto: Luis Gustavo Prado/Secom UnB

 

O auditório da Associação dos Docentes da UnB (ADUnB) foi palco de uma grande homenagem à antropóloga e ativista Lélia Gonzalez, nesta quinta-feira (6). Referência em estudos e debates de gênero, raça e classe, ela recebeu o título post mortem de Doutora Honoris Causa da UnB.

 

O título é atribuído a personalidade que se tenha distinguido pela atuação em prol da educação ou por suas contribuições à sociedade. A titulação foi aprovada pelo Conselho Universitário (Consuni), durante a 523ª reunião, em maio.

 

A homenagem póstuma esteve incluída na programação do Novembro Negro da Semana Universitária (Semuni) 2025. No mês em que é celebrado o Dia Nacional da Consciência Negra (dia 20), a outorga reforça a importância de reconhecer figuras negras importantes para a história brasileira.

 

Além da titulação, foi aprovado o pedido para que o Centro de Convivência Negra (CCN) da UnB passe a levar Lélia Gonzalez no nome. Até então, dos agora 72 homenageados, essa é a segunda vez que UnB concede o título a uma mulher negra, sendo a primeira reconhecida a filósofa Sueli Carneiro, em 2022.

 

RECONHECIMENTO – Como orador, o professor do departamento de Filosofia Herivelto Souza pontuou o peso que tem a homenageada e os destaques de sua trajetória.

 

“Essa honraria acadêmica é um ato simbólico muito importante, não só porque implica a reafirmação enfática e irrevogável dos fatores antirracistas, mas porque é um ato que nos faz não perder de vista a necessidade de seguir e ampliar a inclusão”, comentou o docente.

 

Ele compartilhou a fala com Taynara Rodrigues, mestranda em Filosofia e pesquisadora das relações entre Lélia Gonzalez e a psicanálise. “Uma das grandes contribuições de Lélia foi ter desafiado o consenso, abrindo uma fresta para que outras vozes pudessem emergir e reconfigurar o modo como pensamos o Brasil”, proferiu a discente. Ela falou ainda sobre o legado deixado pela homenageada, em múltiplos territórios acadêmicos, políticos, culturais e populares.

 

Lélia faleceu em 1994, aos 59 anos. Foi atuante durante a ditadura militar e uma das fundadoras do Movimento Negro Unificado. Deixou legado marcante na luta social, antirracista e feminista por meio de uma produção intelectual consistente, sendo a responsável por conceitos como amefricanidade e pretuguês.

 

A homenagem foi recebida por sua neta, Melina de Lima, diretora de educação e cultura do Instituto Memorial Lélia Gonzalez e cofundadora do projeto Lélia Gonzalez Vive. “Estamos com o coração cheio de emoção, orgulho e gratidão. Essa é mais do que uma homenagem acadêmica, é um ato de justiça histórica e o reconhecimento a uma mulher negra que transformou a dor em pensamento, o racismo em denúncia e o silêncio em palavra”, discorreu, emocionada.

 

Melina afirmou que a avó viveu e produziu em um tempo em que ser uma mulher negra intelectual era um gesto de insurgência. “Ela ousou ocupar espaços que lhe negaram e fez do conhecimento um instrumento de libertação coletiva”, disse. Para a historiadora, a titulação representa todas as mulheres negras que constroem o pensamento e a história do país, muitas vezes sem reconhecimento.

 

A diretora do Instituto de Ciências Humanas, Neuma Brilhante, também se emocionou ao falar sobre o significado institucional do reconhecimento e disse que conceder o título à intelectual é também um gesto político, que reafirma o compromisso com a diversidade e o pensamento crítico. “Quando homenageamos alguém, a gente não fala só da história que passou, mas do futuro que queremos construir como Universidade."

 

A familia de Lélia marcou presença durante a homenagem na ADUnB. Foto: Luis Gustavo Prado/Secom UnB

 

A reitora Rozana Naves afirmou que, ao conceder o título, a UnB reconhece o valor intelectual, político e civilizatório de Lélia, “uma das grandes pensadoras deste país”. A gestora ainda enfatizou o compromisso da Universidade com a diversidade e a justiça social. “Para nós, o título não é apenas uma honraria, mas um chamado para abrir espaços, corrigir silêncios e aprender com quem veio antes”, destacou.

 

Participaram da comitiva da homenageada, o filho e o neto, Rubens Rufino e Marcelo de Lima. Também a professora da Universidade Federal de Ouro Preto, Dulce Maria Pereira; a diretora da Faculdade de Comunicação da UnB, professora Dione Moura; as professoras do Departamento de História da UnB Mariléa de Almeida e Ana Flávia Magalhães Pinto; e os professores do Departamento de Filosofia Wanderson Flor do Nascimento e Herivelto Souza, além da mestranda Taynara Rodrigues.

 

TRAJETÓRIA – Nascida em Belo Horizonte em 1935, Lélia era a 17ª filha de 18 irmãos — entre eles o ex-jogador do Flamengo Jayme de Almeida. Assim, ela pôde se dedicar aos estudos por não precisar contribuir para o sustento da família.

 

Ela construiu uma trajetória acadêmica e intelectual marcante, sendo uma das precursoras do feminismo negro. Formada em História, Geografia e Filosofia, pela Universidade Estadual do Guanabara, atual Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), também dedicou-se a antropologia, política social, gênero e etnia e chegou a estudar psicanálise.

 

Lecionou em diversas instituições de ensino e é autora de obras como Lugar de Negro e Festas Populares no Brasil. Suas produções abordaram o racismo, o sexismo e a luta das mulheres negras na sociedade brasileira. É reconhecida ainda por seu forte engajamento político e cultural, tendo participado da fundação do Instituto de Pesquisa das Culturas Negras e do Coletivo Nzinga de Mulheres Negras.

 

NOVEMBRO NEGRO – A homenagem integrou a programação do Novembro Negro na Semuni25, marcando o mês de celebração e reflexão sobre a cultura e consciência negra na UnB. Durante a semana foram realizadas diversas atividades acadêmicas e culturais que destacam a força e importância da identidade preta nos territórios. Entre elas, cine debate sobre raça e gênero, lançamento de livros, brincadeiras e jogos afro-brasileiros e indígenas, exibição de documentários, clubes de leitura, exposições e palestras.

 

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