OPINIÃO

Isaac Roitman é doutor em Microbiologia, professor emérito da Universidade de Brasília e membro titular de Academia Brasileira de Ciências.

Isaac Roitman

 

A retórica (do latim rhetorica, originado no grego rhêtorikê) é considerada uma arte da eloquência, arte de bem argumentar e a arte da palavra. A retórica era compreendida entre os gregos como a estrutura básica do direito e da política, a “arte da persuasão” era uma questão fundamental para a tomada de decisões na democracia grega.

Dois princípios básicos orientam a democracia, desde seu surgimento na Grécia antiga até hoje em dia: a isonomia (direitos iguais aos cidadãos) e a isegoria (direito a voz e voto). Assim, o direito a voz, exigia, em contrapartida, que os cidadãos gregos possuíssem uma grande capacidade de linguagem para expor de forma clara e convincente suas perspectivas.

Desde então, a política se desenvolve a partir do embate de ideias. Com isso, a retórica visa convencer o adversário ou o público a partir da exposição clara das ideias e da capacidade de argumentação, sendo um ponto fundamental da atividade política. Ela é compreendida como um conjunto de regras relativas à eloquência e mais valorizada no exercício da política, do direito e da comunicação.

No Brasil, a retórica é frequentemente utilizada pelos políticos, principalmente em períodos eleitorais. Segundo Hannah Arendt, o discurso político tem por finalidade a persuasão do outro, quer para que a sua opinião se imponha, quer para que os outros o admirem. Para isso, necessita da argumentação, que envolve o raciocínio, e da eloquência da oratória, que procura seduzir recorrendo a afetos e sentimentos.

Uma questão importante vem à tona. Como, quando e como o discurso se transforma em realidade, isto é, algo que é real e verdadeiro. Frequentemente, um discurso político é recheado de promessas que não se cumprem. Algumas vezes, devido à desonestidade do político, outras vezes pelos obstáculos invencíveis, que transformam os discursos em uma manifestação de boas intenções.

Projetos ambiciosos e transformadores levam anos ou décadas para serem concretizados. Infelizmente, no Brasil, a cada governo, os dirigentes pretendem inventar a roda, como se fossem donos da verdade. Se fizermos uma análise histórica de projetos que visavam um progresso social e econômico, vamos verificar que muitos ou quase todos ficaram no meio do caminho.

Infelizmente temos um muro cultural onde priorizamos resultados a curto prazo e somos incapazes de sustentar projetos de longo prazo, utilizando instrumentos e técnicas prospectivas. Uma parte considerável de políticos pensam na próxima eleição, esquecendo que um político saudável deve ter como a principal meta o bem-estar coletivo e o compromisso com as próximas gerações.

Para transformar a retórica em realidade, é preciso atravessar uma ponte sólida e não uma ponte improvisada feita com uma corda bamba que joga as ideias em um abismo. Os pilares dessa ponte devem necessariamente ter o entusiasmo e a energia dos propositores de um projeto, preencher as necessidades e os clamores da sociedade e respeito às leis vigentes.

Uma educação que se priorize o pensar e o criticar será um pré-requisito para separar o joio do trigo no mundo político e no serviço público do Brasil. Oxalá que termos como clientelismo, oportunismo, corrupção, nepotismo e similares não sejam utilizados no futuro, a não ser em análises históricas. É pertinente lembrar o pensamento de Thomas Jefferson: “Gosto mais dos sonhos do futuro do que a história do passado”. Oxalá que sempre a boa retórica se transforme em realidade e verdade.

 

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Publicado no Monitor Mercantil em 06/02/23.

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