Entre o fim de janeiro e o início de fevereiro, uma comitiva formada por estudantes e professores de nove cursos da Universidade de Brasília esteve no município de Marianópolis, em Tocantins, participando de operação do Projeto Rondon.
Após vários finais de semana de treinamento, a equipe formada por oito alunos dos cursos de Comunicação Social, Enfermagem, Medicina Veterinária, Museologia, Saúde Coletiva, Serviço Social e Terapia Ocupacional, e pelos professores Domingos Coelho, da Psicologia, e Ricardo Gaspar, da Engenharia Florestal, iniciou a jornada de 17 dias, concluída em 5 de fevereiro.
CHEGADA – No dia 19 de janeiro, o grupo desembarcou em Palmas, de onde seguiu para o 22º Batalhão de Infantaria do Exército e participou da cerimônia de abertura do projeto. Ali, os estudantes tiveram a oportunidade de conhecer um pouco do trabalho das Forças Armadas, passear pela capital tocantinense e conhecer a equipe da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com quem trabalharam juntos em Marianópolis.
Segundo a estudante de Medicina Veterinária Giula Miranda, chegar ao Tocantins foi o início da realização de um sonho. “Fiquei muito surpresa com a recepção que tivemos no batalhão. Fomos todos muito bem tratados e o alojamento feminino estava todo adaptado pra poder nos receber melhor. A gente sempre tinha lanchinho, repelente, protetor solar e a comida era deliciosa. Além disso, trouxeram atrações locais e fizeram uma formatura do Exército especialmente pra gente. Eu nunca tinha participado de nenhuma cerimônia especial desse tipo e foi tudo muito bonito. Tanto a recepção quanto a cerimônia de abertura marcaram um ótimo começo de operação."
Já no dia 22 de janeiro, os estudantes das duas universidades (UnB e UFRGS) partiram para Marianópolis do Tocantins, acompanhados de um oficial do Exército responsável pela segurança do grupo. O município está localizado a 197 quilômetros de Palmas, com população de 4.352 habitantes (IBGE 2010), IDH de 0,695 (PNUD 2000) e é dividido em assentamentos e zona urbana.
Em Marianópolis, os estudantes utilizaram o primeiro dia para acomodação e para conhecer a cidade e as escolas onde atuariam. Fizeram o primeiro contato com a prefeitura, especialmente para divulgar o projeto. Com violão, sorriso no rosto e muito carisma, os estudantes saíram pela parte central da cidade cantando músicas populares para avisar à população que o Projeto Rondon estava no município com muitas oficinas e capacitação para os marianopolenses.
Para a estudante de Saúde Coletiva Rayane dos Santos, a chegada ao município foi surpreendente. "Sou uma pessoa que mora em uma capital enorme e nunca havia visitado uma cidade assim. Quando cheguei a Marianópolis, fiquei surpresa com a simplicidade da população. Conhecer a realidade daquelas pessoas e ver que condizia com as propostas do nosso cronograma me deixou muito animada. Vi que o planejamento e a dedicação da equipe foram a chave do sucesso para plantar uma sementinha em cada pessoa que participou das oficinas."
ENSINANDO E APRENDENDO – Dada a partida e iniciada a divulgação do projeto, a rotina passou a ser cada vez mais cheia e diversificada. Foram ministradas oficinas sobre comunicação, meio ambiente, tecnologia, produção e trabalho. O espaço físico utilizado pelos rondonistas foi a Escola Estadual David Rollins, responsável pela formação de estudantes do Ensino Fundamental e Médio. A utilização do espaço da escola fez com que os jovens se aproximassem do projeto e divulgassem as atividades para outros moradores de Marianópolis.
As oficinas eram realizadas nos períodos da manhã e da tarde, voltadas para pessoas de qualquer idade e com temas diversificados: coleta seletiva, compostagem, papel reciclado, rádio, jornal audiovisual, entre outros. Todas foram pensadas a partir da demanda do município. Por exemplo, a de compostagem (processo de transformação de matéria orgânica encontrada no lixo em adubo orgânico) surgiu do problema da queima de lixo, algo recorrente na cidade, mesmo com a presença da coleta seletiva. No fim, mais de 200 certificados foram entregues à população.
Segundo Vilma dos Santos, moradora de Marianópolis, o aprendizado da oficina de compostagem vai fazer parte do dia a dia: “A gente sabe que não pode queimar lixo, mas sempre tem um vizinho que não pensa nos outros por aqui. Fazer a compostagem vai ser bom para eu fazer adubo e diminuir o que vai pra lixeira todos os dias”.
Outro fato gerado pelo Projeto Rondon foi a oportunidade que os estudantes tiveram de conhecer dois assentamentos da região, o Piracema e o Manchete, que abrigam praticamente metade da população marianopolense. Nos assentamentos, os estudantes ministraram oficinas nas escolas e fizeram um mutirão para informar sobre a dengue, passando de casa em casa para conversar um pouco mais com os moradores. A experiência nos assentamentos também fez com que os rondonistas tivessem a oportunidade de conhecer na prática a estrutura da reforma agrária.
A estudante de Serviço Social Franciely Ancelmo ressalta a realidade dos assentamentos como uma experiência à parte na operação. “Pude observar que são pessoas que se sentem excluídas da cidade, pois não recebem tanto apoio do governo quanto deveriam. Um dos exemplos que mais me fizeram pensar sobre isso foi quando visitamos o assentamento Manchete e as pessoas disseram que não estavam sabendo do Projeto Rondon na cidade. Eles se queixavam de que não tinham apoio e o acesso à informação era precário dentro dos assentamentos. Isso é algo complicado, foi realmente chocante conhecer uma realidade assim."
Dentro da rotina de ministrar oficinas de capacitação e ter contato com os moradores dos locais visitados, os estudantes puderam enxergar problemas e hábitos diferentes, o que deu maior motivação para continuar trabalhando dentro do município, buscando deixar um legado para os multiplicadores que participavam das oficinas.
Essa motivação e o contato foram pontos de partida para que os estudantes da UnB e da UFRGS entendessem demandas da população e formulassem uma carta ao atual prefeito, Zé do Rui. A carta incluiu propostas vinculadas aos temas das oficinas. Por exemplo, a realização de atividades extracurriculares para dar oportunidades aos jovens de se desenvolver em diversas áreas e incentivar a permanência na escola.
O documento foi entregue na noite de encerramento do Projeto Rondon na cidade, atividade que os estudantes nomearam “Rondon na Feira”, pois foi realizada na feira coberta da cidade. Os moradores tiveram a oportunidade de prestigiar os trabalhos feitos pelos estudantes na Oficina de Jornal Audiovisual, com listas de pontos positivos e negativos do município, além de várias reportagens jornalísticas. O público reunido ainda pôde soltar a voz em um karaokê organizado pelos rondonistas. A cantoria levou agito à noite de encerramento.
RETORNO – Na hora de partir, tanto os rondonistas quanto os marianopolenses tiveram um momento sensível, típico, com muitos abraços e troca de contatos. A despedida foi um dos momentos mais especiais do projeto, como relata a estudante de Enfermagem Kennya Torres. “Foi nesse momento que pude perceber como a esperança dos moradores do município parecia ter voltado. Era como se eles estivessem dispostos a fazer tudo diferente e isso me deixou muito orgulhosa.”
Depois da despedida e transcorridos 13 dias no município, os estudantes retornaram ao 22º Batalhão de Infantaria em Palmas, onde participaram da cerimônia de encerramento do projeto, marcado pelas apresentações finais dos alunos de cinco municípios sorteados. Por coincidência, Marianópolis estava entre eles. Os estudantes da UnB e da UFRGS cantaram uma música cuja letra diz “Rondon é movimento, Rondon é sentimento, Rondon tá aqui dentro e vai continuar”. O refrão traduziu exatamente os sentimentos dos oito rondonistas da Universidade de Brasília, que voltaram pra casa com histórias, sentimentos e aprendizados que não couberam dentro da mala.
Para os participantes do Projeto Rondon, tanto o projeto quanto a extensão proporcionam ao estudante uma oportunidade única de aprender a lidar com a sociedade fora do ambiente acadêmico, o que resulta em aprendizado mútuo, no qual quem está do lado de fora da Universidade pode conhecer a realidade dos universitários e ser beneficiado pelo que eles desenvolvem. O estudante pode aprender sobre um novo mundo ou, como afirma o slogan do projeto Rondon, pode ter uma lição de vida e cidadania.
“O Projeto Rondon me surpreendeu bastante, pois eu tinha muitos pensamentos concretos e ao longo dos dias tudo tomou um rumo diferente. Pude desconstruir muitos tabus. Posso dizer com todas as letras que entrei no Projeto Rondon uma pessoa e saí outra”, conta a estudante Franciely Ancelmo.
Na Universidade de Brasília, para entrar no Projeto Rondon é necessário cursar a disciplina Construção de Projetos Sociais Multidisciplinares, ofertada pelo Decanato de Extensão (DEX). Também é preciso declarar interesse em participar da Operação no Núcleo do Projeto Rondon (localizado na Reitoria) e, claro, ficar atento às informações.