OPINIÃO

 

Fábio Pittella Silva é professor do curso de Farmácia na Faculdade de Ciências e Tecnologias da Universidade de Brasília (FCTS/UnB). Coordenador do Laboratório de Patologia Molecular do Câncer e especialista em Biópsia Líquida pelo Centro de Medicina de Precisão da Fundação Japonesa de Pesquisa sobre o Câncer (JFCR).

 

Ana Cristina Moura Gualberto é pós-doutoranda no Laboratório de Patologia Molecular do Câncer e coordenadora do projeto de edição gênica do SETDB1 pelo sistema CRISPR/Cas9 no câncer de mama.

Fábio Pittella Silva e Ana Cristina Moura Gualberto

 

A ciência só cumpre plenamente seu papel quando caminha de mãos dadas com a sociedade. É nesse encontro entre conhecimento e compromisso coletivo que nascem as transformações mais significativas, especialmente quando o tema é o câncer de mama, uma das doenças que mais desafiam a medicina moderna. Acreditamos que cada avanço científico precisa dialogar com as pessoas, inspirar esperança e, sobretudo, gerar impacto real na vida de quem enfrenta essa doença. Durante o Outubro Rosa, queremos compartilhar um pouco da pesquisa que desenvolvemos no Laboratório de Patologia Molecular do Câncer da Universidade de Brasília (CancerLab-UnB), em que buscamos novos caminhos de compreensão ao câncer de mama.

 

Nesse projeto, apoiado pela Fundação de Apoio à Pesquisa do Distrito Federal (FAPDF), buscamos compreender como as células tumorais conseguem escapar do local de origem e se espalhar pelo corpo. Essa capacidade de invasão, responsável por grande parte das mortes por câncer, não é um simples acaso biológico, mas sim resultado de alterações específicas em genes e mecanismos moleculares. Entre elas, destaca-se a enzima SETDB1, que exerce papel central na regulação epigenética, processo que controla quais genes estão “ligados” ou “desligados” na célula. Observamos que níveis elevados dessa enzima favorecem o comportamento agressivo do tumor, facilitando sua disseminação.

 

A partir disso, investigamos como a inibição de SETDB1 pode se tornar uma estratégia eficaz para impedir a metástase no câncer de mama. Para tanto, utilizamos ferramentas de edição gênica de alta precisão, como o sistema CRISPR/Cas9, o qual permite realizar deleções específicas no genoma, promovendo o nocaute completo do gene de interesse. Essa abordagem possibilita avaliar os efeitos diretos da ausência de SETDB1 no crescimento, migração e invasão tumoral, ajudando a revelar os mecanismos moleculares que impulsionam a progressão do câncer de mama.

 

Sabemos que esses estudos ainda estão em fase experimental, mas acreditamos que eles representam sementes de transformação. Cada experimento e dado gerado, nos aproxima de um futuro no qual o câncer de mama possa ser controlado antes de se tornar letal. No entanto, para que essas descobertas saiam do laboratório, é indispensável que a sociedade reconheça o valor da ciência. Precisamos de investimentos contínuos, de políticas públicas sólidas e de um SUS fortalecido, capaz de incorporar novas terapias de forma acessível e equitativa.

 

O CancerLab, primeiro laboratório da UnB dedicado exclusivamente à pesquisa em oncologia molecular, celebra neste Outubro Rosa 13 anos de compromisso com a ciência, a inovação e o avanço no entendimento do câncer. Durante essa trajetória, contamos com o apoio essencial da FAPDF, CNPq e Ministério da Sáude (DECIT), além da comunidade científica da UnB e de gestores realmente comprometidos com o fortalecimento da pesquisa e da inovação.

 

O Outubro Rosa é mais do que uma campanha de conscientização, é um convite à ação. É o momento de reforçar que prevenção, diagnóstico precoce e tratamento adequado caminham lado a lado com a pesquisa científica. O laço rosa deve simbolizar também o laço entre cientistas e cidadãos, entre laboratórios e comunidades, entre descobertas e vidas salvas.

 

Como pesquisadores nosso compromisso é seguir perguntando, testando, descobrindo e, sobretudo, compartilhando. Fazer ciência é também formar pessoas e construir o futuro do conhecimento. Queremos que cada mulher, ao ouvir falar de nossos estudos, saiba que estamos dedicados a transformar o medo em esperança. E é com essa convicção que buscamos um futuro em que o câncer de mama seja enfrentado com estratégias terapêuticas cada vez mais eficazes, fruto do conhecimento e da inovação.

ATENÇÃO – O conteúdo dos artigos é de responsabilidade do autor, expressa sua opinião sobre assuntos atuais e não representa a visão da Universidade de Brasília. As informações, as fotos e os textos podem ser usados e reproduzidos, integral ou parcialmente, desde que a fonte seja devidamente citada e que não haja alteração de sentido em seu conteúdo.