OPINIÃO

Paulo José Cunha é professor da Faculdade de Comunicação da Universidade de Brasília, jornalista e escritor.

Paulo José Cunha

 

Está rodando na internet um abaixo-assinado que exibe com perfeição a raiz dos problemas sociais que nos afligem desde que aquela caravela lançou âncora no mar de Porto Seguro: a injusta - e pornográfica - concentração de renda que faz com que a riqueza acumulada nas mãos de apenas 1% dos mais ricos seja o dobro – sim, o dobro! - de tudo o que os outros 99% possuem.

 

Lá no final, vou deixar o link para quem quiser assinar o documento. Por enquanto vou apenas comentar seus principais pontos. A situação não é apenas espantosa – é revoltante. Até porque, como já escrevi em artigos anteriores sobre o tema, a concentração de renda é imoral e injusta porque a ampla maioria desse 1% dos mais ricos não aplica um centavo em favor dos mais necessitados. Apenas espoja as nádegas numa montanha de dinheiro.  E lá de cima contempla o bando de miseráveis que, cá embaixo, os carrega nas costas. Vamos lá:

 

1) O primeiro e mais indecente ponto são os supersalários. É urgente romper com a injustiça de uma casta de privilegiados ganhar acima do teto constitucional por meio de penduricalhos que “transformam cargos públicos em castas de privilégios”.
2) Isenção fiscal para quem ganhar até R$5.000,00. E não o contrário, representado pela taxação ridícula dos super-ricos que se locupletam de uma legislação que praticamente os isenta do pagamento de impostos e têm dividendos de suas aplicações isentos de taxação.
3) Pelo fim do foro privilegiado que protege deputados e senadores de responderem na justiça pelos seus crimes. Passa da hora de coloca-los em pé de igualdade com o cidadão que não detém cargo eletivo.
4) Fim das chamadas “emendas secretas”, pelas quais é possível despejar caminhões de dinheiro nos feudos eleitorais sem qualquer critério de necessidade social, ao mesmo tempo em que deixam regiões efetiva e urgentemente necessitadas sem um tostão para o enfrentamento de seus problemas. Pior: o cidadão não sabe de nada, pois não há qualquer critério de transparência na destinação dessas emendas. Os “autores” só aparecem na hora do voto, afirmando que foi deles a iniciativa de destinar milhões para isso e aquilo e, portanto, acharem-se merecedores dos votos que os (re)elegerão. E assim os autores das tais emendas perpetuam-se no poder, impedindo a renovação das lideranças políticas.
5) O documento trata também de um aspecto vergonhoso e que exige mudança urgente: os grandes devedores, aqueles que acumulam dívidas bilionárias com a União – donos de latifúndios, bancos e empresas – precisam quitar seus débitos e devolver à sociedade o que devem, e não ficar protegidos por “acordos” ou ações judiciais que se arrastam interminavelmente, concretizando a impunidade.
6) O documento toca noutro ponto crucial: o fim dos subsídios bilionários aos já ricos, outro privilégio que aprofunda a desigualdade e a injustiça, pois beneficia os ricaços e não oferece nenhum centavo de contrapartida aos pequenos. O documento sintetiza: “É hora de investir esses recursos na população, não em privilégios”.
7) Especificamente em relação ao Judiciário, o documento preceitua a necessidade da proibição de magistrados participarem de eventos financiados por entidades privadas, a fim de não comprometer sua imparcialidade.
8) O documento defende a criação de uma campanha pela divulgação do Portal da Transparência, “para que qualquer cidadão possa fiscalizar os gastos, salários e benefícios de deputados, senadores e membros do Executivo”.
9) Por último, uma síntese do desejo popular: “Queremos um Brasil onde os impostos sejam justos, onde os poderosos também paguem a conta, onde ninguém esteja acima da lei, e onde cada centavo público sirva para melhorar a vida da maioria”.

 

Simples assim. Pelo que se depreende da leitura do documento, parece que a sociedade finalmente começa a sintetizar seus anseios por justiça social, equidade de direitos e o fim dos privilégios. Ainda outro dia o Congresso se insurgiu abertamente contra tudo isso ao derrubar o IOF, um imposto regulatório que atinge os mais abastados, ao mesmo tempo em que criou mais vagas de deputados, elevando as já altíssimas despesas, que chegam à casa de R$ 278 mil por mês para cada um deles. Sabe o que significam esses números? Um deputado federal custa por ano o equivalente à renda de 133 trabalhadores brasileiros, de acordo com levantamento do Poder360. Os deputados custam individualmente, em média, até R$ 3,283 milhões por ano, enquanto o rendimento médio anual per capita do brasileiro é de R$ 24.828,00.

 

Ou seja: enquanto não extirparmos os privilégios dos super-ricos não vamos sair do atoleiro social em que patinamos há séculos, e que se agrava cada dia mais. Quem quiser assinar o documento, acesse aqui.

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