Jean Lucas Vinhas Medeiros de Carvalho
A explicação de que a tarifa de 50% imposta por Donald Trump às exportações brasileiras é resultado de “provocações” de Lula é conveniente (para Trump), para quem adota seu discurso e, claro, para quem gosta de acreditar que relações internacionais funcionam como briga de bar. Mas, como costuma acontecer, a realidade é menos novelesca e mais estratégica: não se trata de birra, mas de cálculo político e econômico. Trump não precisa de bonés, frases de efeito ou fotos com líderes “errados” para retaliar comercialmente. Ele já fez isso antes com parceiros históricos como Canadá e União Europeia, que jamais o chamaram de “imperador” ou “genocida”.
O padrão é simples: quando é útil para sua base eleitoral, ele fecha o mercado, ponto! O agronegócio brasileiro, altamente competitivo em várias frentes, é alvo natural dessa lógica, especialmente em cenários de disputas políticas acirradas. O argumento de que o Brasil “mereceu” a tarifa porque cobra impostos altos sobre importações é igualmente falacioso. Seguindo essa lógica, qualquer país poderia retaliar outro de forma arbitrária, ignorando completamente os mecanismos da OMC – Organização Mundial do Comércio.
É curioso como, para alguns, a violação de regras internacionais é inadmissível quando vem de Caracas ou Pequim, mas perfeitamente aceitável quando parte de Washington. Atribuir toda a crise ao discurso de Lula também exige um salto olímpico de lógica! É como culpar o termômetro pela febre. Sim, declarações políticas têm peso, mas imaginar que uma economia de US$ 26 trilhões toma decisões comerciais dessa magnitude apenas porque um presidente estrangeiro falou algo atravessado é subestimar (ou fingir ignorar) a engrenagem do lobby e das pressões internas.
Outro ponto saborosamente contraditório é a receita “abra o mercado e tudo se resolve”. É o tipo de conselho que se dá para o vizinho, não para si mesmo. Os Estados Unidos, a União Europeia e a China são campeões mundiais em protecionismo seletivo, mas dificilmente renunciam a suas barreiras sem exigir contrapartidas duras. Abrir de forma unilateral, como alguns sugerem, seria entregar bandeira branca antes mesmo de sentar-se à mesa de negociação, algo que nenhum país que se leve a sério faria.
No fundo, a narrativa do “foi provocação” serve mais para desviar o foco de um fato incômodo. Trump usou o Brasil como exemplo para reforçar sua agenda “America First” e acenar para eleitores que querem ver produtos nacionais protegidos, pouco importando se isso prejudica setores inteiros de outros países. O resto é ruído político, útil, mas não determinante. Portanto, não se trata de “chumbo trocado”. Trata-se de um país, os Estados Unidos, jogando o jogo que sempre jogou: proteger seus interesses a qualquer custo, usando retórica política como justificativa e aproveitando-se de divisões internas no país alvo. O erro não foi a fala dura de Lula, foi acreditar que, com ou sem fala dura, Trump trataria o Brasil de forma diferente.
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