OPINIÃO

Norma Diana Hamilton é professora do Departamento de Línguas Estrangeiras e Tradução (LET/IL/UnB). Coordenadora do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros (NEAB).

Norma Diana Hamilton

 

A comunidade brasileira negra merece o reconhecimento por suas conquistas na sociedade, perante a recência da abolição da escravatura no Brasil, apenas 137 anos, sendo que a escravização perdurou por mais de 300 anos nesse contexto. E vale notar que, após a promulgação da Lei Áurea em 1888, para exacerbar a situação dos(as) negros(as) no país, houve a execução do Código Penal de 1890, que em seu Capítulo XIII, “Dos Vadios e Capoeiras”, estimulava o encarceramento em massa de pessoas negras.

 

Diferentes medidas de aniquilamento dessa população, anteriores ao Código Penal, incluem a lei de terras de 1850, impedindo que a população negra pudesse adquirir terras. A lei sobre o direito à educação, de 1837, dificultava o acesso de crianças negras nas chamadas “escolas de primeiras letras”. Por outro lado, o governo incentivou o crescimento de uma população imigrante branca no Brasil, financiando sua chegada, providenciando, sem custos para ela, terras e recursos financeiros (veja o Código Penal de 1890).

 

Diante desse histórico, o avanço da comunidade afro-brasileira se deve aos próprios esforços, por meio de sua organização política em movimentos sociais para a conquista de políticas de inclusão, perante um Estado que pretendia seu extermínio. A abolição da escravatura e a garantia de direitos à liberdade, à moradia, à educação, à existência são devidas principalmente às ações de abolicionistas negros e negras, e à resistência dos(das) escravizados(as).

 

Dentre nomes de abolicionistas negros e negras, há: Luiz Gama, advogado que libertou mais de 500 escravizados; André Rebouças, engenheiro civil que desenvolveu projetos de abastecimento de água e saneamento em áreas carentes; José do Patrocínio, jornalista que teve papel importante na denúncia das atrocidades da escravidão, assim como na produção da Lei Áurea; Maria Firmina dos Reis, primeira romancista brasileira, cuja obra e discursos em conferências contribuíram para que a sociedade aceitasse enxergar a humanidade dos(das) escravizados(as), conseguindo maior adesão à causa abolicionista; e diversos outros.

 

No que tange à contribuição da luta dos(das) próprios(as) escravizados(as) africanos(as) e crioulos(as) (nascidos(as) no Brasil) no combate à escravização, destaca-se que, desde o surgimento, realizaram diferentes formas de revolta, além de construir abrigos, comunidades (Quilombos), em que podiam viver em liberdade. A princesa do Congo, Aqualtune, escravizada no Brasil no século XVII, liderou revoltas e fundou um dos primeiros quilombos (SOBRAL, 2024). Não é por acaso que se comemora o dia 25 de maio no Brasil, o Dia da África, para resgatar figuras importantes como essas!

 

Demais insurreições executadas por escravizados(as) incluem a Revolta do Engenho Santana (1789), a Revolta de Carrancas (1833), a Revolta dos Malês (1835), a Balaiada (1838-1841), a Revolta de Manuel Congo (1838) e a Insurreição de Queimada (1849), dentre diversos outras, silenciadas, na maioria, na historiografia convencional.

 

Essa historiografia quer nos fazer acreditar, inclusive, que a abolição chegou em função do projeto de industrialização no mundo afora. A isso, salienta-se que, antes mesmo que foi assinada a Lei Áurea, mais de 73% da população negra já estava livre (CENSO, 1872), graças à articulação dos movimentos abolicionistas e/ou aos esforços próprios de escravizados(as), que haviam conseguido comprar sua alforria ou fugir para quilombos.

 

Eis o que se comemora no dia 13 de maio: a memória da luta e da conquista de direitos para e pela comunidade negra. Não se trata da glorificação da perspectiva portuguesa, narrativa essa que põe como protagonista a Princesa Isabel, que, como se entende pelas colocações supracitadas, foi pressionada por escravizados(as) e abolicionistas, e, assim, não teve escolha, a não ser que assinar o documento jurídico e simbólico do fim da escravização.

 

Diante disso, respeitemos a (com)memoração do dia 13 de maio, data tão importante da história da luta dos povos negros no Brasil!

 

Referências

CÂMARA DOS DEPUTADOS https://plenarinho.leg.br/index.php/2019/11/protagonismo-negro-na-luta-pela-abolicao/ (acesso em 21.05.2025).

PINTO, Ana Flávia Magalhães. Escritos de liberdade: literatos negros, racismo e cidadania no Brasil oitocentista. Campinas: Editora da UNI- CAMP, 2018.

SOBRAL, Cristiane. Como não ser racista: mesmo que você jure que não é! Brasília, DF: Sindilegis, 2024.

 



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