PROFISSIONALIZAÇÃO

Programa realizado na Biblioteca Central prepara estudantes da Apae-DF para o mercado de trabalho

Cláudia Luciana da Silva, formanda do curso voltado à conservação de livros. Foto: Luis Gustavo Prado/Secom UnB


A rotina é a mesma de qualquer atividade laboral: ser pontual, usar vestimenta adequada à função, cuidar dos materiais de trabalho. Marli Pires Maciel, coordenadora do Programa de Extensão Higienização, Conservação e Pequenos Reparos de Bens Culturais, realizado com estudantes da Associação de Pais e Amigos dos Excepcionais do Distrito Federal (Apae-DF), é quem descreve as atividades.

 

Com foco profissionalizante, o curso certificou, nesta quinta-feira (6), treze novos aprendizes. Ao longo de dez anos de atividades, completados neste mês, 49 jovens foram certificados. A formatura ocorreu no auditório da Reitoria e contou com a presença da vice-reitora da Universidade de Brasília (UnB), Sônia Báo. 

 

O curso é ministrado na Biblioteca Central da UnB (BCE), no campus Darcy Ribeiro. Lá, os estudantes aprendem a fazer higienização e pequenos reparos do acervo da Biblioteca. Como resultado da parceria com a Apae-DF, a UnB cede o espaço, materiais e alimentação no Restaurante Universitário (RU).

 

“A Universidade está à disposição da comunidade, especialmente na Extensão, com a nossa expertise, que é levar o conhecimento para fora. Se tem alguma energia para mudar o mundo é o conhecimento. O programa da APAE soma 10 anos de sucesso. Nesse período, estamos cumprindo o nosso papel da universidade. Temos gerado emponderamento social”, afirma o decano de extensão Valdir Steinke. 

 

Cláudia Luciana da Silva, 33, está na iniciativa há dois anos e é uma das formandas. Nas palavras dela, quer trabalhar para ganhar dinheiro. “Quero comprar roupas. Gosto de rosa, roxo, alaranjado e azul. Gosto bastante de calças”, diz.

Formandos do Programa de Higienização, Conservação e Pequenos Reparos de Bens Culturais. Foto: Luis Gustavo Prado/Secom UnB

 

EXPOSIÇÃO – Além da formatura, o dia marcou a abertura da Exposição Mãos que Cuidam – Enlaces Entre Pessoas e Acervos, em celebração aos dez anos do programa. A mostra está localizada em dois ambientes da BCE, no subsolo e na sala de vidro, no térreo. O visitante encontrará uma memória do Programa, com fotos e histórico dos trabalhos desenvolvidos.


A exposição foi idealizada pelo Centro de Atendimento de Estudos Psicológicos da Universidade de Brasília (Caep), que, uma vez por semana, se reúne com os estudantes da Apae-DF. Nesses encontros, grupo de alunos de Psicologia oferece suporte na formação das habilidades sociais e no desenvolvimento de maturidade e de autonomia dos aprendizes.


Junto com Marli Pires, duas outras professoras acompanham o progresso dos estudantes: Orlandina Spíndola de Souza e Idê Borges dos Santos. “A proposta é qualificar os aprendizes para incluí-los no mercado laboral”, resume Marli. “Aqui, eles praticam a higienização com olhar pedagógico. O curso oferece tanto a parte técnica quanto a social. Tentamos formar o mais próximo de um ambiente de trabalho”, continua. “Não é porque têm limitação, deficiência, que vamos sonegar informações básicas para o funcionamento em um ambiente de trabalho. Somos professoras, mas aqui atuamos como chefe”.

Professoras Idê Borges, Orlandina Spíndola e Marli Pires. Foto: Luis Gustavo Prado/Secom UnB


TÉCNICA – A rotina de aprendizado engloba a higienização das capas (de acordo com o material em que é feita) e a limpeza página por página, usando escova de juba ou trincha. Os aprendizes anotam quantidade de páginas que foram limpas para ter estimativa da produtividade e realizar controle de qualidade.

 

De segunda a quinta-feira, a jornada começa às 8h e segue até as 16h, com parada de 1h30 para almoço no RU. O curso se dá em sistema de rodízio entre várias turmas.

 

“Cada um deles tem um tempo. Nunca temos uma turma homogênea. Temos os que estão prontos para o certificado, os que estão em aprendizado e os que estão no início. A última certificação ocorreu em 2014”, conta a coordenadora.

 

Os formados seguem para o mercado de trabalho, em que são inseridos na modalidade de emprego apoiado. Trabalham em contratos anuais renováveis. As remunerações variam, sendo que o piso corresponde ao salário mínimo. O primeiro contrato de trabalho foi firmado em 2008, com a Câmara dos Deputados. “Desde então, outros contratos se seguem devido à eficiência que têm apresentado”, afirma Marli.

Aprendiz realiza limpeza da capa de livro. Foto: Luis Gustavo Prado/Secom UnB

 

Hoje, a Apae-DF tem acordos também com o Senado Federal, Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Supremo Tribunal Federal (STF), Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e Superior Tribunal de Justiça (STJ).

 

Os cursos acontecem de acordo com a ocorrência de contratos ou disponibilidade de vagas. Com os aprendizes, vão os estagiários que se formam juntos, no mesmo curso. Eles serão apoiadores dos aprendizes nos locais de trabalho.


MATURIDADE – “Nossa proposta é trabalhar conforme a idade. Desenvolvemos trabalho integrado com professores e famílias. Os familiares costumam ter compreensão limitada sobre o estudante, porque ignoram que cresceram”, avalia Marli Pires.


“Para fazer parte do programa deve-se preencher os seguintes critérios: ser matriculado na Apae; ter laudo médico de aptidão; ter perfil centrado para desempenhar a atividade; usar equipamento, que inclui jaleco e kit de trabalho, e saber se organizar”, explica a coordenadora.

 

Os candidatos a aprendizes fazem três meses de estágio, para avaliar compatibilidade com as atividades do curso. São divididos em equipes, em que cada um desempenha uma função de acordo com o potencial. Para serem certificados, participam do curso por, no mínimo, um ano.

Turma da Apae-DF higieniza página por página dos livros. Foto: Luis Gustavo Prado/Secom UnB

 

“Não podemos nos distanciar da realidade. Trabalhamos com foco no potencial. Todos têm deficiência intelectual. Estimulamos e cobramos assiduidade e pontualidade. Formação é um todo”, pondera a professora. “A formação de hábitos é o grande desafio. A técnica é o mais fácil. Nosso trabalho é o de incorporar uma rotina. O aprendiz chega e tem de funcionar, tem de ser responsável pelas suas obrigações”, detalha. “Há também a convivência em grupo. Eles precisam saber resolver suas dificuldades com soluções adultas”.

 

“Temos adesão das famílias em 99% dos casos. Eles ficam deslumbrados a partir do momento em que veem o potencial, o desenvolvimento e a maturidade do aprendiz”, afirma. “Inclusão é isso: sair para prestação de serviço, para a convivência e interação. Que não fiquem só fechadinhos”, encerra Marli Pires.