Lançamento: Autoridade Prática


Livraria Sebinho 19:30 - 00:00:00 21/03/2018 - 21/03/2018

Livro discute política das águas e sua luta “por um lugar à mesa”

“Instituições não nascem prontas dos textos das leis: precisam ser trazidas à vida pelas pessoas que as criam”. Esta é uma das ideias centrais do livro Autoridade Prática: ação criativa e mudança institucional na política das águas do Brasil, que acaba de ganhar edição em português com o selo da Editora Fiocruz. Originalmente publicado em inglês pela Oxford University Press, o livro analisa o processo de construção de instituições ligadas à gestão da água no Brasil. Ao enxergarem as instituições como processos, as autoras – as professoras Rebecca Neaera Abers, da Universidade de Brasília, e Margaret E. Keck, da Universidade Johns Hopkins – ajudam a compreender não só os caminhos da política da água, mas também a dinâmica de outras políticas públicas e seus espaços participativos.

A Lei Federal 9.433, de 1997, instituiu a Política Nacional de Recursos Hídricos e criou o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos. Apesar de todas as limitações e dificuldades hoje reconhecidas, essa Lei foi saudada por seu caráter inovador e seu potencial democrático e participativo. Ela definiu a bacia hidrográfica como a unidade territorial para a implementação da política de recursos hídricos; e o comitê, por sua vez, como a instância de gestão nessa unidade territorial. Os comitês de bacia hidrográfica, criados pela nova legislação, reuniam a sociedade civil, o setor privado e o governo.

“O novo modelo de gestão de água pretendia racionalizar o uso e ampliar a participação da sociedade no processo decisório”, afirmam as autoras, cujo objetivo inicial era estudar os comitês de bacias hidrográficas em funcionamento. Como uma primeira constatação, observaram demoras longas entre a criação dos comitês pela letra da Lei e seu surgimento como instituições que funcionavam na prática. “Compreendendo isso, decidimos que nosso principal objeto de estudo deveria ser o processo de becoming, de vir a ser (ou não) uma arena operante de políticas públicas”, explicam.

É a partir dessa perspectiva que as autoras apresentam no livro partes da história de 16 comitês de bacia hidrográfica, do Baixo Rio Jaguaribe (CE) ao Rio Santa Maria (RS), estudados ao longo de 12 anos. Ao investigarem a criação desses novos arranjos institucionais para a gestão da água no Brasil, elas verificaram que muitos comitês tinham contextos bastante semelhantes em relação aos problemas relacionados à água, à cultura política, ao capital social e ao desenvolvimento econômico, entre outros aspectos. Só que, apesar dos contextos tão similares, os resultados eram radicalmente distintos.

Enquanto alguns comitês não prosperavam, outros tornavam-se espaços vibrantes de tomada de decisão e de ação – ou adquiriam “autoridade prática”, conceito construído pelas autoras e que dá nome ao livro. “Parecia que não eram os contextos que explicavam as diferenças, mas, sim, o que as pessoas envolvidas faziam com os recursos disponíveis naqueles contextos”, avaliam. “Em termos gerais, descobrimos que os comitês funcionavam melhor quando seus membros construíam uma interpretação própria do que lhes cabia fazer e dela extraíam as ações concretas que poderiam realizar”, resumem.

Ao analisarem as lutas em torno da elaboração da legislação paulista e nacional de água e de como essas leis deveriam ser interpretadas, as autoras acabam discutindo também temas como a configuração do poder no federalismo brasileiro, as alianças partidárias, as barganhas jurisdicionais entre órgãos governamentais e, especialmente, as novas formas de participação. “Neste livro, argumentamos que as instituições passam a existir quando as pessoas agem criativamente para fazer o árduo trabalho organizacional de reconfigurar ideias, recursos e relacionamentos, persuadindo atores influentes à sua volta a se engajarem com novas instituições na prática de fazer as coisas de forma diferente”, contam as autoras.

Rebecca e Margaret lembram que, no percurso da pesquisa que originou o livro, foram surpreendidas por grupos de indivíduos determinados a fazer com que as organizações funcionassem melhor. “Tal perseverança parece ser ainda mais necessária neste momento histórico em que tantos projetos transformadores perdem fôlego, no Brasil e no mundo”, comentam as autoras na Apresentação à Edição Brasileira.

Lançamento: Autoridade Prática