OPINIÃO

César Augusto Tibúrcio Silva é professor do Departamento de Ciências Contábeis e Atuariais/FACE, da Universidade de Brasília. Graduado em Administração pela UnB e em Contabilidade pela
Unieuro, mestre em Administração pela UnB e doutor em Controladoria e Contabilidade pela USP. Com livros publicados, atua nos temas: mensuração contábil, finanças de empresas, demonstrações contábeis, avaliação de empresas e custos no setor público.

César Augusto Tibúrcio Silva

 

 

Antecedentes


A primeira vez que escutei sobre o processo eletrônico foi em agosto de 2015. Rapidamente a gestão da Universidade criou uma comissão, inicialmente responsável por estudar a possibilidade de sua adoção. Com membros do Arquivo Central, Centro de Informática e DPR/DPO, a comissão iniciou seus trabalhos estudando a legislação e, principalmente, fazendo visitas a outros órgãos que já o tinham adotado. Nas visitas estava claro que existia uma grande satisfação dos usuários dos diversos órgãos que tinham adotado o processo eletrônico. Também foi destacada a economia de custos e a mudança na forma como serviço era executado. Este contato com quem já tinha implantado o processo eletrônico trouxe duas certezas importantes: era vantajosa a sua adoção e isto tinha que ser feito de maneira abrupta.


O relatório foi entregue dentro do prazo com a recomendação pela adoção. A comissão que fez o estudo preliminar foi encarregada de cuidar da sua implantação. A gestão da Universidade destinou à comissão as condições necessárias: espaço físico, exclusividade de tempo para comissão, prioridade nos investimentos e, principalmente, apoio institucional. Ficou definido que o processo eletrônico seria implantado na UnB em 180 dias.


Para que isto fosse possível, foram feitos esforços em três frentes: legitimação, investimento e treinamento. Com respeito à legitimação, a UnB assinou um acordo com o Ministério do Planejamento para utilização do Sistema Eletrônico Nacional (SEI). Isto permitiu que alguns aspectos do programa originalmente criado no judiciário pudesse ser adaptado à realidade da Universidade. Ao mesmo tempo, iniciou-se um processo de divulgação do sistema. Sobre o investimento, foram adquiridos equipamentos que seriam cruciais para a digitalização dos processos físicos existentes e em tramitação na UnB. Finalmente, do início do ano até a data inicial de utilização do processo eletrônico, o treinamento atingiu a mais de mil pessoas. A preocupação com o treinamento incluiu a preparação de material de apoio, palestras realizadas de sensibilização e campanhas nas páginas da internet.

 

A adoção


O dia 16 de maio foi aguardado com ansiedade. Apesar de todo o cuidado com os possíveis problemas, havia uma expectativa que o início de implantação do processo eletrônico poderia provocar um tumulto administrativo na Universidade. Mas isto não ocorreu. Há um mês a UnB está adotando o processo eletrônico e podemos dizer que poucos problemas foram enfrentados pela equipe responsável pela adoção. É verdade que alguns processos ainda não estão adequadamente incorporados à nova vida digital da UnB, como é o caso de algumas demandas dos alunos. O sistema também apresentou falhas com os navegadores Chrome e Firefox para alguns usuários. E ocorreram problemas de digitalização dos processos.

 

Apesar disto, o processo eletrônico, trinta dias após seu início na UnB, é uma realidade. No dia 16 de maio um pouco mais de 500 processos tramitaram. No segundo dia este número cresceu para 672 e nos seguintes o crescimento foi bem mais lento.

 

A adoção do processo eletrônico trouxe algumas consequências positivas bem claras. Em primeiro lugar, é inegável a melhoria na prestação dos serviços e o ganho de eficiência. Se anteriormente um processo orçamentário de interesse da Faculdade do Gama tinha que ser transportado por mais de quarenta quilômetros, hoje isto é feito usando o comando “enviar processo”. E a partir daí a Faculdade do Gama pode acompanhar o andamento do processo em todas as instâncias e os despachos que foram realizados.

 

Outro benefício é a economia de recursos. Para criar um processo ou fazer um despacho não é mais necessário imprimir os documentos. Com o fim das idas e vindas do papel físico, as pessoas podem se dedicar a tarefas mais nobres. Neste momento não sabemos ainda qual o impacto em termos monetários da decisão, mas acreditamos que existe e não é desprezível.

 

Não é possível esquecer a transparência, com a possibilidade de acompanhar os processos e verificar os despachos que foram feitos. Este é um ganho imensurável para o usuário. E isto pode ser feito a partir da tela do computador, sendo possível comparar o tempo de tramitação do seu processo com os outros em andamento.

 

Finalmente, o processo eletrônico é uma garantia na integralidade dos documentos. Alguns processos importantes que tramitam pela UnB possuem mais de mil páginas. No processo físico é muito difícil garantir a integralidade do mesmo; no digital, a incorporação de um documento impede que o mesmo seja retirado ou trocado, trazendo uma grande tranquilidade para o gestor.

 

Os Desafios


Um mês já permite antever sete grandes desafios que, em minha opinião, temos pela frente (e não necessariamente em ordem de relevância). Em primeiro lugar, haverá uma grande cobrança pela eficiência das áreas meio da Universidade. A possibilidade de enxergar o processo permite que o interessado tenha uma noção de quanto tempo o mesmo está parado no computador. Mais ainda, o processo eletrônico pode ser distribuído para mais de um usuário, permitindo a análise paralela, o que não era possível antes. As áreas envolvidas devem estar preparadas para esta cobrança e, se for possível, atender a expectativa criada. A adoção do processo eletrônico permite que métodos sejam revistos e melhorados. Um exemplo ocorreu na minha unidade: no terceiro dia da adoção fizemos uma reunião de equipe para discutir uma maneira diferente de fazer um serviço; a adoção do processo eletrônico induziu a redução de etapas de tramitação, aumentando a velocidade da tramitação.

 

Um ponto relevante resultante do processo eletrônico é a preservação digital. Perguntas sobre o que fazer com os processos em papel existentes, quais aqueles que podem ser descartados e como fazer a preservação dos novos processos ainda precisa ser adequadamente respondido. Este aspecto da adoção já esta presente nas primeiras reuniões da comissão responsável pelo estudo da implantação do processo eletrônico na UnB. E ainda não foi resolvido. É importante salientar que mesmo os órgãos da administração pública que já adotaram há mais tempo o processo eletrônico ainda não possuem uma solução adequada para este problema.

 

A adoção do processo eletrônico melhorou a transparência dos atos dos gestores. Mas ainda precisamos aprender a lidar melhor com a questão: quais documentos devem ser sigilosos e quais não. Em alguns documentos, como aqueles relacionados às sanções administrativas, é necessário manter o sigilo, para preservar o nome de um servidor. Ao mesmo tempo, é necessário garantir a maior transparência possível da administração pública.

 

Durante os meses que antecederam a adoção do processo eletrônico foi realizado um grande esforço por parte do Centro de Informática para permitir a ligação com os sistemas eletrônicos. Mesmo assim, muito ainda necessita ser feito para que o usuário possa criar processo eletrônico a partir de um dos sistemas existentes na UnB. Isto inclui rever os sistemas existentes para incorporar a funcionalidade da criação do processo eletrônico no próprio sistema, como é o caso de diversas solicitações dos discentes nos sistemas acadêmicos da UnB.

 

O quinto desafio corresponde ao treinamento do usuário. Durante a fase que antecedeu a adoção do processo eletrônico foram treinados mais de mil funcionários. Os cursos tentaram ser objetivos e completos. Além disto, permitiu o acesso a materiais didáticos (apostilas e vídeos estão disponíveis para os interessados). Isto sem falar das palestras realizadas em diversos prédios da Universidade. Em termos proporcionais, mais de 20% dos funcionários, técnicos-administrativos e docentes, foram treinados nos dias anteriores à adoção do processo eletrônico. Mesmo com todo este esforço, ainda não é suficiente.

 

Algumas áreas, talvez por não acreditar que a Universidade adotaria realmente o processo eletrônico, não enviaram nenhum funcionário para treinamento; em outros casos, poucos é verdade, o treinado somente participou de um período do curso; e existe o fato de que novos funcionários foram incorporados ao quadro de pessoal desde a implantação do processo eletrônico. Estes fatos fazem com que seja necessária a continuidade do treinamento por mais algumas turmas. Isto já foi previsto anteriormente, mas torna-se fundamental uma análise para verificar se as demandas foram atendidas.

 

O sexto desafio é lidar com o processo eletrônico nos próximos meses. Sendo agora uma realidade na vida da Universidade, é necessário estabelecer certas competências que atualmente estão sendo executadas pela comissão de implantação. Esta comissão foi criada com um prazo de três meses, sendo seus trabalhos encerrados em agosto. Depois disso, é preciso determinar que área será responsável pelo cadastramento das estruturas, pela atualização dos recursos humanos e suas áreas respectivas, entre outras tarefas.

 

Finalmente, o sétimo desafio é a relação do processo digital da UnB com outras áreas do setor público. A sensação que temos é que a Universidade será um exemplo para outras instituições no país. Cumprimos com uma grande antecedência os prazos que foram estabelecidos pelo Ministério da Educação com respeito à necessidade de adoção do processo eletrônico. Em razão do seu porte e complexidade, a UnB já é uma referência neste aspecto. Antes mesmo de completar um mês de existência, já temos solicitações de visitas técnicas para conhecer como a Universidade lidou com este aspecto. Entretanto, é necessário agora pensar que um processo digital criado na UnB pode tramitar por outro órgão. Questões relacionadas com o barramento e certificação digital precisam ser consideradas nos próximos dias.

 

A análise da implantação do processo eletrônico revela que tivemos um grande avanço na administração da Universidade. A equipe responsável pelos estudos e a implantação está de parabéns pelo excelente trabalho realizado. Durante os últimos meses foi perceptível o cuidado desta equipe em antever problemas, apresentar sugestões e colocar em prática caminhos que facilitassem a adoção com poucos percalços. O processo eletrônico é um caso de sucesso, onde a UnB mostrou que boas soluções podem surgir na administração pública.

 

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