OPINIÃO

Bárbara Medeiros é doutora e mestra em Administração pela UnB com foco em diversidade, gênero e sexualidade. É administradora, pedagoga, professora, pesquisadora, palestrante e mentora acadêmica e empresarial (T&D, D&I, GP e ESG).

 

Bárbara Novaes Medeiros

 

Participei do curso Mudanças climáticas, Carbono e Redd+ na Amazônia indígena, realizado na Terra Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima - RR, com lideranças indígenas do Amazonas, Tocantins e de Roraima, ministrando uma palestra e dialogando no grupo temático de "Gênero e Clima".

Eu tive o privilégio de ser facilitadora do diálogo sobre a perspectiva de gênero e mudanças climáticas, a partir da reflexão de como os homens e as mulheres indígenas percebem e sentem os efeitos das mudanças climáticas. Aprendi com os participantes que os impactos são desiguais.

Há impactos no campo da saúde, educação, economia, o que tem afetado a própria sobrevivência dos povos originários. Eles sempre se dedicaram ao cuidado com os rios e as florestas, o grande bioma brasileiro. Para eles, a terra é sagrada e o rio é vida!

Os povos indígenas vivenciam na pele o enfrentamento às mudanças climáticas, quando percebem a inversão de valores na mercantilização global da preservação climática.

O que é isso na prática?

Estão preocupando muito com dinheiro no mercado de capital, enquanto há espécies sendo extintas, há perdas de manivas, frutas, diversidade de produtos e sementes, devido às secas severas, o que tem aumentado o consumo de alimentos processados. Isso tem elevado à industrialização e consequentemente, aumentado a poluição com o excesso de produção de lixo.

Ouvi dos povos indígenas que “a água está mais distante, porque os igarapés próximos, secaram!”

“Os rios têm secado em períodos que não eram comuns para secar.”

“Não se sabe mais a data para plantar.”

“As plantas medicinais estão se perdendo!”

“Os passarinhos demoram de cantar.”

“As flores demoram para abrir.”

“Os frutos apodrecem antes da colheita.”

“A criação dos animais foi alterada.”

“Sofre o plantio, a agricultura e a pesca indígena com o calendário, que está todo alterado!”

“O tempo de trabalho mudou", considerando que antigamente, a lida diária começava cedo e terminava mais tarde. E hoje, devido estar muito quente, com o calor intenso, não tem como trabalhar até tarde.

A chuva e o sol não chegam mais de mansinho como antigamente com seus sinais claros no meio ambiente. Há enchentes e calor intenso. São recorrentes as queimadas provocadas pelas más ações humanas e a exploração ilegal das terras pelos garimpos, que violentam o respeito à vida, especialmente de crianças, jovens e mulheres indígenas. Há aumento do uso de drogas, exploração sexual, crime organizado, o que tem provocado também, a migração das terras e a organização familiar.

É notável que o modo coletivo de vida dos povos indígenas mudou, em decorrência dos efeitos climáticos e seus impactos desiguais, muito além dos que foram citados, considerando as perspectivas de gênero.

Com esse cenário, questiono como fica a cultura e a tradição dos povos indígenas, a partir do reconhecimento da organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e dos direitos originários sobre as terras, que eles têm assegurado na constituição brasileira?

O debate é amplo, é sobre vidas, e não apenas indígenas, ecoa também sobre a sobrevivência de povos não indígenas, ou seja, de toda a sociedade. Há muitas ações para serem colocadas em práticas para termos um Brasil mais sustentável e inclusivo. A participação social inclusiva talvez seja a principal! É importante ouvir as pessoas, não somente em seções plenárias e audiências públicas, mas também nas florestas e na beira dos rios. E reforço, ouvir todas as pessoas sem distinção de gênero nas tomadas de decisão. Não há justiça climática sem justiça de gênero.

Juntos(as), em aliança, homens e mulheres indígenas podem contribuir com mais força para o enfrentamento às mudanças climáticas, ao pensarem em demandas e soluções para suas comunidades. O poder das alianças também está presente entre povos indígenas e não indígenas, como um caminho promissor para mudanças discursivas, sociais e práticas. Essa luta é política!

Em celebração ao Dia Internacional dos Povos Indígenas (09/08), o meu desejo é pelo engajamento das lideranças políticas nacionais e internacionais quando o assunto é o de mudanças climáticas, gênero e povos indígenas!

Por fim, compartilho como é bom aprender mais que ensinar!

Eu construí novas formas de pensar sobre mudanças climáticas, gênero e povos indígenas com simplicidade e profundidade de modo a estimular a luta coletiva em prol do enfrentamento das mudanças climáticas. Afinal, “não é sobre adaptação, é sobre enfrentamento!” É luta coletiva! Vem conosco?

O curso foi promovido pelo Centro Amazônico de Formação Indígena (CAFI) da Coordenação das Organizações Indígena da Amazônia Brasileira (COIAB) e seus parceiros, como Conselho Indígena de Roraima (CIR), Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), Environmental Defense Fund (EDF), The Nature Conservancy (TNC), Programa Vozes pela Ação Climática (VAC), Programa Janela B (FAZ) e demais apoiadores(as). Acompanhe a @coiabamazonia nas redes e junte-se à luta dos povos indígenas da Amazônia" .

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