OPINIÃO

Roberta Simões Nascimento é professora na Universidade de Brasília (UnB), advogada do Senado Federal, doutora em Direito pela Universidade de Alicante (Espanha) e pela UnB. 

Roberta Simões Nascimento

 

Uma nova interpretação do artigo 142 da Constituição tem gerado debates acalorados no meio jurídico. Do texto As Forças Armadas (...) destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem vem-se extraindo permissão para uma suposta intervenção militar ou, em vernáculo mais suavizado, a atuação das Forças Armadas como poder moderador (cf. aqui e aqui ) no caso de um poder invadir a competência de outro.


A controvérsia e a repercussão gerada em torno do tema, no entanto, deixaram de abordar o problema subjacente que a proposta hermenêutica queria resolver: quem é competente para controlar os ministros do STF? Em que ocasiões se pode fazê-lo? De que maneira?


Esse vazio é criador e criatura de aberrações. Não é de hoje que o Poder Judiciário é criticado pela tradição de limitadas investigações e punições de juízes. De tão raros e reservados que são esses processos, quase não se fala no regime jurídico da responsabilização de magistrados da Corte Máxima. Como consequência, alguns pensam que sequer existe accountability para os ministros do STF e que esses podem fazer tudo.


Desde logo, convém registrar que resulta impensável e inconcebível usar o artigo 142 da CF para transferir o controle do STF às Forças Armadas, pois isso violaria a separação dos poderes, princípio fundamental da república (artigo 2º). Na prática, o emprego da referida norma constitucional equivaleria a suprimir o STF, atentando contra uma cláusula pétrea (artigo 60, §4º, inciso III) e fazendo o presidente da República incorrer em crime de responsabilidade, atacando o livre exercício do Poder Judiciário (artigo 85, inciso III).


No entanto, isso não cria um salvo-conduto para que os ministros do STF possam fazer o que quiserem sem responsabilização. Mesmo os que exercem a jurisdição constitucional são passíveis de falhas e críticas, mas cujo controle deve ser feito única e exclusivamente nos termos previstos na Constituição e na lei.


Nesse sentido, deve-se recordar que os ministros do STF estão sujeitos à responsabilização política ou impeachment pelo Senado Federal, a quem compete privativamente julgá-los por crime de responsabilidade (artigo 52, inciso II). O rito segue a Lei nº 1.079/50, a condenação depende do voto favorável de dois terços dos votos do Senado Federal e a sanção consiste na perda do cargo, com inabilitação, por oito anos, para o exercício de função pública, sem prejuízo das demais sanções judiciais cabíveis. Embora esse mecanismo seja o mais lembrado, não é o único.


Há o regime de responsabilização criminal, que seguirá o rito da Lei nº 8.038/90. Nesse caso, os ministros do STF também se submetem ao julgamento dos próprios pares nos crimes comuns, conforme o artigo 102, inciso I, alínea b , da CF, cuja competência também se estende para o julgamento de ação de improbidade administrativa conforme a questão de ordem na Pet nº 3211 . Quando o crime comum for de ação penal pública, a iniciativa cabe ao procurador-geral da República, de ofício ou provocado pelo ofendido (via representação), conforme for o caso.


Do ponto de vista disciplinar, os ministros do STF ainda se submetem à Loman (Lei Orgânica da Magistratura Nacional, LC nº 35/79), cujas disposições, nas palavras do próprio ministro Gilmar Mendes, constituem um regime jurídico único para os magistrados brasileiros [1] , pelo que resultaria impossível deixar de fora os próprios ministros do STF, como magistrados que são.

 

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Publicado originalmente em Infojus-GO em 24/6/2020

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