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OPINIÃO

José Matias-Pereira é economista e advogado. Possui doutorado em Ciência Política pela Universidade Complutense de Madri (UCM-Espanha) e pós-doutorado em Administração pela Universidade de São Paulo (FEA/USP). É professor-pesquisador do Programa de Pós-Graduação em Ciências Contábeis da Universidade de Brasília. Autor, entre outros livros, de Finanças Públicas, 7. ed. GEN-Atlas, 2018.



José Matias-Pereira

 

O Brasil está vivenciando uma crise econômica, política e ética sem precedentes na sua história. Na medida em que o governo se mostra cada vez mais acuado e incapaz de sair de sua letargia, aumenta o questionamento por parte dos espertos em economia, direito e política se a presidente Dilma Rousseff ainda reúne as condições políticas e éticas para continuar governando o Brasil. A população, por sua vez, entre perplexa e assustada, anseia que sejam encontradas saídas adequadas para resolvê-las. Frente a esse cenário preocupante, permito-me fazer uma análise dos efeitos da introdução de novos fatos no cenário econômico e político, em especial, os decorrentes da divulgação dos nomes dos políticos que serão investigados pelos desvios ocorridos na Petrobras.

 

A decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki, de aceitar pedido de abertura de inquérito para investigar políticos proposto pelo procurador-geral da República (PGR), alcançou 49 pessoas, das quais 47 políticos, por suposto envolvimento com o esquema investigado na Operação Lava Jato. Nesse rol de investigados, encontram-se 22 deputados federais, 12 senadores, 12 ex-deputados e uma ex-governadora, pertencentes a cinco partidos, e dois "operadores" do esquema.

 

O efeito imediato da divulgação da lista dos envolvidos nas investigações da PGR no âmbito da Operação Lava Jato no Supremo Tribunal Federal, além de elevar o nível de indignação da população e de piorar a desgastada imagem e a credibilidade do governo, foi a elevação dos conflitos a níveis preocupantes, em especial, nas relações institucionais e pessoais envolvendo os presidentes da Câmara dos Deputados e do Senado Federal com a presidente Dilma Rousseff. Esses novos fatos estão contribuindo para agudizar os conflitos entre os poderes Legislativo e Executivo, gerando, assim, uma nova pauta política no país.

É oportuno recordar que os embates e as retaliações ao governo Dilma, nos campos político e institucional, começaram um pouco antes da divulgação da lista da PGR. Isso ficou configurado com a devolução ao Poder Executivo, pelo presidente do Senado, da medida provisória (MP) que trata da desoneração da folha de pagamentos das empresas; seguida pela aprovação do projeto de lei que define regras mais rígidas para a criação de partidos; e da proposta de emenda constitucional (PEC) da bengala, que aumenta a idade de aposentadoria de juízes. A inclusão e aprovação dessas medidas, contrárias aos interesses do Palácio do Planalto, são demonstrações do nível de contrariedade do presidente do Senado, que se sentiu desconsiderado com a inclusão do seu nome na lista da PGR. Tudo indica que outras matérias, que não são de interesse do governo, serão incluídas na pauta política do Senado, com destaque para a votação da emenda constitucional que obriga ocupantes de cargos executivos (prefeitos, governadores e presidente) a saírem de suas funções para disputar a reeleição, e a apreciação do veto da presidente da correção da tabela de imposto de renda de 6,5%.

O ambiente político para o governo na Câmara dos Deputados também é desfavorável. Com a divulgação da lista, na qual também consta o nome do presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), o relacionamento político entre aquela autoridade e o governo Dilma vem se deteriorando de forma acelerada. Numa recente entrevista, o presidente da Câmara disse que “o procurador-geral da República agiu como aparelho, visando à imputação política de indícios como se todos fossem partícipes da mesma lama. É lamentável ver o procurador, talvez para merecer a sua recondução, se prestar a esse papel. E criminalizar a minha doação oficial de campanha sem criminalizar a dos outros é um acinte à inteligência de quem quer que seja. Sabemos exatamente o jogo político que aconteceu e não dá para ficar calado sem denunciar a politização e aparelhamento da PGR.” Nesse sentido, sinalizou não ter dúvidas de que o governo está por trás disso, e que o procurador escolheu contra quem abriria inquérito. Por isso vai “subir o tom”. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, numa tentativa para amenizar os conflitos, nega que haja interferência do governo nas investigações da Operação Lava Jato.

Os argumentos utilizados pela presidente Dilma, no pronunciamento recente que fez por ocasião do Dia Internacional da Mulher, veio aumentar o nível de desconforto no contexto político do país. Esse desconforto é decorrente, entre outros fatos, da insistência da mandatária de recusar-se a fazer um “mea culpa” (minha culpa) das suas responsabilidades pelos erros cometidos no seu primeiro mandato no campo econômico. Existe um quase consenso de que a decisão de implementar políticas econômicas inconsistentes conduziu o Brasil para difícil situação que se encontra. Isso pode ser constatado no baixo desempenho da economia, inflação elevada, taxas de juros altas, agravamento do mercado de empregos. Nega-se a reconhecer, também, que a instalação de uma sofisticada quadrilha criminosa na Petrobras, que levou a empresa a bancarrota, decorreu da promiscuidade existente entre o Executivo e o Legislativo, que está solapando as bases da República.

 

É oportuno ressaltar que cada país é responsável pelas suas vitórias e derrotas. É comum nos momentos de crises políticas agudas que os dirigentes dos países afetados por elas passem a “acreditar naquilo que querem acreditar”. Este me parece ser o caso da presidente Dilma, na medida em que tenta distorcer a realidade, conforme revelam os teores dos seus pronunciamentos, da gravidade e extensão da crise político-econômica e ética do país. Recusa-se a perceber, ainda, que a “coalização presidencial”, no seu segundo governo, está em processo de franca deterioração, tanto na Câmara como no Senado. Essa crise política, que está se instalando rapidamente no país, contaminando a economia, coloca em risco a aprovação do pacote de políticas de austeridade fiscal, essencial para a retomada de credibilidade do governo e do país junto ao mercado e os investidores.

 

Pode-se concluir, por fim, que a soma dos impactos negativos na sociedade dos efeitos da adoção de políticas de austeridade fiscal, executadas para recuperar uma economia destroçada por incompetência e corrupção no primeiro mandato do governo Dilma, e pela provável demora na punição dos responsáveis pela corrupção na Petrobras, vão aumentar a tensão social, colaborando para introduzir temas indigestos para o governo na pauta política do país, em especial, o pedido de abertura, pela Câmara dos Deputados, de um processo de impeachment da atual mandatária.

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