OPINIÃO

Professor Titular do Departamento de Antropologia (DAN/UnB), dos Programas de Pós-Graduação do Departamento de Antropologia e do Departamento de Estudos Latino-americanos (ELA/UnB). Pesquisador do CNPq e coordenador do Laboratório e Grupo de Estudos em Relações Interétnicas (LAGERI) DAN/UnB.

Stephen G. Baines1

 

Os direitos dos povos indígenas, dos quilombolas e de outras populações tradicionais enfrentam enormes desafios no momento atual, em que o Brasil está passando por um período de insegurança jurídica a partir dos discursos do presidente da República contrários às demarcações de terras. Durante sua campanha eleitoral, e desde a posse de Jair Bolsonaro, os ataques aos direitos indígenas se intensificaram, desrespeitando o Artigo 231 da Constituição Federal de 1988, que assegura aos povos indígenas a demarcação das terras que tradicionalmente ocupam. Os ataques atendem a políticas para a reprimarização da economia brasileira dentro do modelo neoliberal e visam abrir caminho para a expansão do agronegócio, incentivando invasões de terras indígenas, além da expansão do setor de mineração, madeireiro e os grandes projetos de hidrelétricas.

 

Desde o seu primeiro dia, o governo atual atacou de forma visceral os direitos indígenas por meio da Medida Provisória 870, de 1º de janeiro de 2019, que transfere a competência para demarcação de terras indígenas da Fundação Nacional do Índio (Funai) para o Ministério da Agricultura, esvaziando a Funai deste atributo e subordinando as terras indígenas diretamente aos interesses da Frente Parlamentar da Agropecuária ou bancada ruralista. Ao mesmo tempo, o que restou da Funai foi transferido do Ministério da Justiça para o novo Ministério da Mulher, Família e Direitos Humano.

 

Há alguns anos, a bancada ruralista vem ganhando espaço dentro do Congresso Nacional, aliada a grandes consórcios de empresas de agronegócio, mineração e hidrelétricas com ataques aos direitos indígenas por meio de proposições legislativas, entre as quais o PEC 215/2000, visando passar o atributo de demarcações de terras indígenas da Funai para o Congresso Nacional com intenção de paralisar as demarcações de terras indígenas; a PLP 227/12, a PEC 237/13, a PEC 038/99, entre outras. Em 2015, a CPI Funai/Incra 2 propõe a criminalização de lideranças indígenas e quilombolas, além de antropólogos e outros que defendem esses direitos, e o Parecer AGU n. 001 de 2017 tenta impor a tese do “marco temporal”, desta maneira criando argumentos anticonstitucionais que visam suspender as demarcações. Nos últimos anos, as revisões de leis e o desmonte das instituições responsáveis pela proteção dos direitos indígenas e quilombolas e do meio ambiente visam à criminalização de movimentos sociais, lideranças, entidades de apoio e pesquisadores para atender aos interesses de grandes corporações apoiadas pelo Estado interessados em invadir e explorar as terras indígenas.

 

A Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB) recorreu à Procuradoria-Geral da República (PGR) solicitando uma ação judicial contra a MP 870 por atribuir ao Ministério da Agricultura a demarcação das terras indígenas. É fundamental lembrar que o problema de terras no Brasil não é o fato de que 13,8% das terras do país são reservadas aos povos indígenas, mas a concentração das terras nas mãos de latifundiários.

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1 Professor Titular do Departamento de Antropologia (DAN/UnB), dos Programas de Pós-Graduação do Departamento de Antropologia e do Departamento de Estudos Latino-americanos (ELA/UnB). Pesquisador do CNPq e coordenador do Laboratório e Grupo de Estudos em Relações Interétnicas (LAGERI) DAN/UnB.