HOMENAGEM

Às 9h dessa sexta-feira, dia 22, o professor Isaac Roitman será homenageado pelas contribuições que deu à Universidade em quatro décadas de atuação profissional

Foto: Mariana Costa/UnB Agência

 

A Universidade de Brasília havia sido criada há apenas dois anos quando um golpe derrubou, em 1964, o presidente do país João Goulart. Em 1972, sob o governo do general Emílio Garrastazu Médici, o Brasil vivia o apogeu da repressão política imposta pela ditadura militar. Nesse mesmo ano, a convite da UnB, mudava-se para Brasília o santista Isaac Roitman, respeitado pesquisador na área de Microbiologia. Começava aí uma relação de 40 anos com a instituição, que será coroada nesta sexta-feira, 22 de junho. Isaac Roitman receberá, às 9h, no auditório da Reitoria, o título de Professor Emérito da Universidade.

 

Roitman será o 76º professor a receber a reverência, que celebra uma trajetória profissional acadêmica ativa e diversificada. Formado em Odontologia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC) e com pós-graduação em Microbiologia na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), além de quatro pós-doutorados em Microbiologia pela Pace University, Hebrew University at Jerusalem, University of Kent e University of Sussex, Roitman acabou desenvolvendo na UnB a maior parte de sua trajetória. “A UnB me acolheu, meus quatro filhos cresceram na Colina e estudaram aqui”, conta.

 

O início de sua carreira na UnB coincidiu com os esforços da Universidade de superar o trauma pós-golpe militar. “Em 1965, a Universidade viveu uma crise muito séria. Muitos professores foram demitidos naquele contexto de repressão política e muitos outros, em solidariedade, pediram demissão. A partir daquele ano, a Universidade tinha alunos, mas não tinha professores”, conta. “As aulas eram dadas por professores de várias universidades, que vinham dar uma semana de aulas em Brasília e depois iam embora. No final da década de 1960, a Universidade começou a fazer um quadro de professores novamente. Foi nessa época que eu vim”.

 

O Instituto de Ciências Biológicas, assim como as outras unidades acadêmicas, estava desfalcado na época. Roitman afirma que até 1974 houve um processo de formação de novos grupos em todas as áreas do conhecimento. “Tínhamos a missão de reestruturar a vida acadêmica da Universidade. Era essa a minha motivação e de meus colegas. Estávamos muito unidos nesse entusiasmo”, relembra.

 

DESAFIOS - Em quatro décadas de UnB, o professor assumiu diversas funções, dentro e fora da Biologia: chefe de Departamento, coordenador da Pós-Graduação, decano de Pesquisa e Pós-Graduação, coordenador de comunicação institucional da UnB, presidente do Comitê Editorial da Revista Darcy. Dentre tantos desafios, Roitman aponta aquele que considera ter sido o maior: o Decanato de Pesquisa e Pós-Graduação, entre 1985 e 1989, durante a gestão de Cristovam Buarque. “Saí de um campo específico para ter relação com todas as áreas acadêmicas. Foi ali que consegui entender o que é uma universidade”, afirma.

 

Para o professor, a função fundamental da universidade é a formação de profissionais que atuarão na sociedade. Essa formação, em sua opinião, deveria ser a mais ampla possível para aprimorar o papel social de todos. Segundo ele, os estudantes não deveriam limitar-se, na vida universitária, a seus respectivos nichos acadêmicos. “Infelizmente, as universidades em geral estão dentro de um sistema que está muito longe dessa função em termos de qualidade. Se você perguntar a um estudante de qualquer área, prestes a se formar, a quantas mesas redondas de outros Departamentos ele assistiu, o resultado vai ser zero ou quase zero. Um levantamento entre professores mostrará algo semelhante. A universidade não se integra. Esse não é um problema isolado, mas de todo o sistema”, avalia.

 

Na universidade que ele gostaria de ver, os estudantes deveriam aproveitar os anos acadêmicos não só para conquistar uma boa formação profissional na área em que pretendem trabalhar, mas também buscar conhecimento em outros setores. “Essa interação pode ser estimulada de várias maneiras. Uma medida que poderia ser feita é apresentar aos calouros, assim que eles entram, o que é a universidade. Mas eles já chegam com a pressão de disciplinas, horários, bibliografia”, observa. Ele também defende a redução do tempo em que os alunos devem estar em sala de aula. “Em países mais avançados, os estudantes passam a metade do tempo em sala de aula, comparando-se com o Brasil. Isso porque eles devem se envolver com outras atividades acadêmicas, não só em sua própria área de estudos”, afirma.

 

Roitman acredita que é possível trabalhar uma nova missão para as universidades e que corrigiria uma assimetria que ele identifica nos três pilares acadêmicos. “Os pilares da universidade são ensino, pesquisa e extensão. Valoriza-se muito a pesquisa em detrimento do ensino e da extensão. Deveríamos ter um equilíbrio”, defende. Ele diz que a universidade deveria se aproximar mais da sociedade. “Não deve haver um canal com a sociedade. Deve haver um ‘Rio Amazonas’ de colaboração com a sociedade, que é quem nos sustenta”, argumenta.

 

RELAÇÕES - Em tantos anos de vivência acadêmica, Roitman orgulha-se das relações que construiu na UnB. “Não tenho nenhum inimigo na Universidade. Posso andar pelos corredores sem precisar desviar de ninguém”, conta com satisfação. Uma boa amostra disso foram os vários acenos amigáveis que ele recebeu e retribuiu durante a entrevista que deu à UnB Agência, em um ambiente sugerido por ele: um banco de madeira no térreo do prédio da Reitoria. “Esse é um dos melhores escritórios possíveis, não concorda?”.

 

Aos 73 anos, Roitman aposentou-se há 17 anos como professor da UnB, mas nunca deixou de trabalhar, o que o motiva a brincar: “Daqui a pouco me aposento da aposentadoria”. Ele é membro titular da Academia Brasileira de Ciência desde 1995. Atualmente, integra a Comissão UnB 50 anos e coordena dois projetos: uma comissão ad hoc na UnB, chamada Núcleo do Futuro, que pretende integrar diferentes regiões por uma rede tecnológica, e um grupo de Educação na Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC). Seu maior incentivo para persistir trabalhando por mudanças de paradigmas e melhorias no sistema educativo vem da família. “Ter netos amplia os horizontes e me fez olhar mais para o futuro”, afirma. Foi a relação amorosa com os cinco netos que o inspirou a aceitar o convite para gerenciar, de 2011 até abril de 2012, a Subsecretaria de Políticas para a Criança do GDF.

 

Na Comissão UnB 50 anos, Roitman defende com vigor uma ideia que considera salutar para o sistema educacional: a criação de um Decanato de Pré-Graduação. “A Universidade passaria a se preocupar com os estudantes antes que eles se tornassem universitários. Se o ensino médio fosse de qualidade, não precisaríamos nos preocupar com isso, mas não é o que ocorre. O nosso ensino básico é uma tragédia”, ressalta. Por meio desse possível Decanato, a Universidade passaria a se envolver com a formação de professores de ensino básico e a realizar cursos e palestras nas escolas.

 

REALIZAÇÃO - O título de Professor Emérito a Isaac Roitman foi uma solicitação do professor Jaime Santana, do Departamento de Biologia Celular. O pedido foi aprovado em relatório assinado pelo professor Mário Diniz de Araújo Neto que, ao aceitar a solicitação, ressaltou características de Roitman, como “a inegável qualificação profissional, a relevante atuação acadêmica, a sólida contribuição para o desenvolvimento do campo da Biologia e da formação científica de seus estudantes”. E é justamente nesse último quesito que reside a maior fonte de realização profissional do professor: “Fico contente com homenagens e condecorações, é um reconhecimento, mas o maior sucesso para mim é ter colaborado na formação de indivíduos que fazem a diferença”.

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