PESQUISA

Semelhança de ancestrais da planta com a espécie cultivada é inédita. Artigo foi publicado na revista Nature Genetics online


Uma pesquisa realizada na UnB, em parceria com a Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia e um consórcio internacional, terminou o sequenciamento dos genomas de duas espécies ancestrais do amendoim e descobriu que em uma delas há similaridade de 99,96% com a que cultivamos hoje. O dado, inédito no cenário mundial, contribui para a história agrícola da América do Sul.

 

“Este trabalho é o resultado de um grande consórcio de pesquisadores de 26 instituições do Brasil, EUA, China, Japão e Índia”, relata David Bertioli, professor da UnB e principal autor do artigo publicado na revista Nature Genetics em fevereiro.

 

A dificuldade de identificação do genoma, contornada pela egressa do doutorado Dra. Bruna Vidigal, deriva da presença massiva de retrotransposons - pedaços do DNA que se replicam e podem mudar sua posição dentro da sequência genética. Eles correspondem a cerca de 60% das informações do genoma.

 

O amendoim cultivado e consumido nos dias de hoje, Arachis hypogaea é resultado de um cruzamento ocorrido entre duas espécies silvestres diploides diferentes – Arachis duranensis e Arachis ipaënsis. Em virtude dessa origem, o amendoim é tetraploide, ou seja, possui dois genomas, chamados subgenomas A e B. Cada célula dessa leguminosa abriga quatro cópias de cada cromossomo - ao invés de duas, como é o caso das espécies diploides.

Merritt Melancon/ UGA


A expectativa dos cientistas era de que o subgenoma A fosse parecido com o tipo A. duranensis e o B com o tipo A. ipaënsis. A surpresa veio quando o índice de semelhança entre B e  A. ipaënsis foi de 99.96%. Esse resultado indica que o genoma sequenciado é descendente direto da população que deu origem ao amendoim, o que o torna uma relíquia viva.

 

Os pesquisadores sabiam que se tratava de uma espécie ancestral. Eles esperavam encontrar um alto índice de semelhança, mas não tanto quanto o que o trabalho revelou. A alta correspondência genética foi encontrada em análise de amostras coletadas por outros pesquisadores nas décadas de 60 e 70 e guardadas em bancos de germoplasma no Brasil (Embrapa), na Argentina, na Índia e nos EUA.

 

“Extraímos o DNA das amostras, o sequenciamento foi feito na China e a análise nos EUA e no Brasil”, relata o professor David Bertioli.

 

A publicação é outro sucesso que a equipe comemora, já que a revista é classificada como a segunda em genética e hereditariedade e seu índice de alcance é 29,6. Para se ter ideia, uma publicação em veículo com alcance acima de 4,8 recebe a classificação A1 da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Essa é a maior classificação que a entidade oferece para a produção de capital intelectual.

Beatriz Ferraz/Secom UnB


“O resultado nos deu certeza de que conseguiríamos publicar em uma revista de alto impacto”, diz Bruna. “É o paper da minha vida”, completa.

 

O coordenador do Programa de Pós-graduação em Biologia Molecular, professor Robert Miller, explica o orgulho que o programa tem em alcançar mais esse sucesso. “A publicação na Nature Genetics prova que nosso programa está voltado para a excelência e compete mundialmente com as melhores pesquisas na área”, enfatiza. O programa pelo qual Bruna defendeu o título tem conceito 6 na Capes.

 

A ORIGEM DO AMENDOIM – Os povos sul americanos cultivam espécies de Arachis desde os tempos pré-históricos, mas apenas a espécie A. hypogaea transformou-se completamente por meio da domesticação para se tornar uma cultura de importância global.

 

A América do Sul é considerada o local de nascimento de A. hypogaea. As populações do genoma A foram encontradas próximas ao centro de origem do amendoim. No entanto aquelas com genoma B foram identificadas mais ao norte em uma região com menor altitude. A leguminosa provavelmente foi levada para sua atual localização por habitantes pré-históricos da área.

 

O LEGADO – As informações reunidas pelos cientistas do consórcio estão disponibilizadas em uma base online de acesso público. O trabalho revela dados moleculares que podem ajudar em outras pesquisas genéticas. Dentre elas, a produção de variedades resistentes à doenças, tolerantes à seca e com maior produtividade.

 

O trabalho também pode ajudar no estudo e melhoramento de outras leguminosas, como a soja, por exemplo.