OPINIÃO

Alexandre Kehrig Veronese Aguiar é professor de Teoria Social e do Direito da Universidade de Brasília, pesquisador associado do Centro de Estudos em Direito da União Europeia (Universidade do Minho, Portugal) e do Centro de Políticas, Direito, Economia e Tecnologias da Comunicações (Ccom) da UnB.

Alexandre Veronese

 

Tramita no Congresso Nacional o Projeto de Lei do Senado nº 2.630/2020. O referido projeto tem sofrido uma avalanche de críticas de entidades da sociedade civil. Dentre elas, cabe destacar a questão relacionada à identificação dos usuários das redes sociais, seja por meio da remessa de cópia de documentos pessoais, seja pela habilitação da conta por meio de número de telefonia móvel pessoal.

 

Em vez de adentrar no debate sobre o conteúdo do Projeto de Lei, o presente texto irá discorrer sobre um tema que com ele se relaciona: o incentivo da regulação da Internet, no Brasil, pelo Poder Judiciário. A intuição se refere às dificuldades sociais e políticas, as quais se contrapõem à construção de regulação administrativa efetiva para a Internet.

 

Valeria pesquisar esse tema e tentar encontrar respostas: por que confiamos mais no Poder Judiciário do que em um ente da administração pública federal para essa tarefa?

 

Podemos retornar o debate sobre a produção de leis para a regulação da Internet ao momento anterior ao Marco Civil da Internet (Lei nº 12.935/2014). É bem sabido que um dos estopins para a sua produção foi o desenrolar do Projeto de Lei nº 84/1999, conhecido como "Lei Azeredo".

 

Esse Projeto de Lei previa uma intensa criminalização de condutas na Internet. Nos seus objetivos, estavam abarcados temas muito relevantes, tal como o combate à pornografia infantil. Porém, a movimentação contrária ao Projeto se baseava na contraposição à criminalização de condutas como um modo hábil de regulação da Internet, uma vez que se postulava que o ideal seria normalizar as relações jurídicas – contratuais e não contratuais – que dão margem ao funcionamento da mesma no Brasil. Além disso, era postulada a aplicação de princípios fundamentais para tal regulação, os quais já haviam sido enunciados no decálogo do Conselho Gestor da Internet (CGI.br).

 

O fato é que a "Lei Azeredo" e o projeto original do Marco Civil da Internet, de 2009, estavam parados no Congresso Nacional. Foi necessário o escândalo internacional PRISM, em 2013, no qual Edward Snowden revelou a existência de um sistema eletrônico de coleta e de análise maciça de metadados, sob gestão dos Estados Unidos da América. Essas revelações geraram uma crise mundial, levando o tema da regulação da Internet para o primeiro plano das políticas públicas de diversos países.

 

No caso da União Europeia, onde já havia regulação administrativa sobre a proteção de dados pessoais, isso desencadeou um processo de fortalecimento dessas políticas públicas. No caso de países como o Brasil, no qual isso não existia, foi dado um primeiro passo nessa direção. O Marco Civil da Internet acabou por ser a resposta brasileira para o problema.

 

Todavia, olhando em retrospectiva e de forma fria, o Marco Civil da Internet foi uma resposta tímida. Como já dito, o cerne da regulação da Internet nas políticas públicas da União Europeia se dá a partir da regulação administrativa. É com base em entidades administrativos independentes - as autoridades de proteção de dados pessoais – que é feita tal política.

 

O debate do Marco Civil da Internet acabou por não produzir uma regulação semelhante, uma vez que havia um forte dissenso sobre a proteção de dados pessoais no Brasil. O inciso III do artigo 3º da Lei nº 12.936/2014 bem indica que o tema, naquele momento, havia sido postergado e ficaria sem previsão de solução. Como não havia a possibilidade criar uma legislação para a proteção de dados pessoais no Brasil, também inexistia a perspectiva de criar uma autoridade para garantir a sua aplicação.

 

Clique aqui para ler o texto na íntegra.

 

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Publicado originalmente em Jota Info em 3/7/2020

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