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OPINIÃO

Dioclécio Campos Júnior é professor emérito da Universidade de Brasília, doutor em Pediatria e membro titular da Academia Brasileira de Pediatria.

 

 

Dioclécio Campos Júnior

 

A era da ciência tem produzido sólidos conhecimentos em todos os campos de pesquisa. São recursos que, se fossem bem utilizados, poderiam, de fato, ter contribuído para o verdadeiro progresso da humanidade, avanço que não ocorreu na devida proporção. As evidências científicas, disponibilizadas ao longo do tempo, não têm merecido a devida valorização como fonte de energia construtiva de uma sociedade saudável da espécie humana. De fato, o desenvolvimento socioeconômico que tomou conta do planeta baseia-se unicamente na lógica do lucro que abastece os interesses dominantes. Tudo o mais é menosprezado.

Grande parte das pesquisas científicas envolve os componentes físicos, químicos, biológicos e sociais do universo ecológico. Todavia, a relevância do meio ambiente para a qualidade de vida das pessoas é desprezada. Exemplo demonstrativo desse argumento é a crescente poluição dos espaços urbanos em que vive a maioria da população do mundo. No passado, não havia a comprovação dos efeitos prejudiciais da fumaça, bebida alcoólica, cigarro e barulho sobre a saúde das pessoas. Com o progresso da ciência, já não restam dúvidas sobre os males que provocam. Porém, a necessária prevenção de tais agravos não é promovida pelos governantes. Por isso, os agentes poluidores deterioram cada vez mais o meio ambiente das cidades.

Os dados da Organização Mundial da Saúde revelam que a maior taxa de mortalidade no planeta já não é mais a das doenças transmissíveis. Prevalecem, no novo século, os efeitos letais das enfermidades causadas pelos referidos agravos ambientais. O estresse é outro distúrbio que tomou conta do perfil comportamental das pessoas, criado pelo modelo consumista e poluidor imposto às novas gerações.

A poluição atmosférica deteriora a saúde das populações urbanas. O tráfego de veículos automotores é progressivamente maior nas cidades. A fumaça por eles emitida expõe a maioria dos habitantes ao risco de diversas morbidades potencialmente letais. São doenças cardíacas, acidente vascular cerebral, câncer do pulmão e a doença pulmonar obstrutiva crônica cuja sigla é Dpoc. Sem falar dos acidentes de trânsito, cujas vítimas morrem ou sobrevivem com sequelas irreparáveis.

Outra situação que atinge os moradores das cidades é a poluição sonora. Resulta dos ruidosos automóveis, ônibus, caminhões e motocicletas; do impacto das buzinas e alarmes; e de megaeventos em locais estratégicos, que lesam parcelas significativas da população. Esse agente poluidor é um dos mais agressivos à saúde humana. Cresce sem limites.

Pesquisas científicas comprovam o que diz a sabedoria popular: "O barulho é ensurdecedor!" De fato, está provado que a exposição ao ruído diminui a capacidade de audição. Por seu lado, gera distúrbios do sono com sérias consequências; afeta a capacidade de concentração mental, indispensável ao equilíbrio das atividades cotidianas; e acentua os índices de estresse, tornando-se fator predisponente da hipertensão arterial.

As crianças são as maiores vítimas desse cenário tão agressivo. Muitas delas sofrem os maléficos efeitos do cigarro, desde a vida intrauterina. O impacto é a redução do crescimento fetal, que gera o recém-nascido de baixo peso, com o risco de repercussões na vida futura. Além disso, a ansiedade da gestante repercute fortemente nessa fase de vida em que é formado o organismo da nova criatura. O consumo de bebida alcoólica na gravidez é outro agravante para o feto, causando-lhe a síndrome alcoólica fetal, com prejuízos consideráveis para o novo ser humano.

A exposição da criança à poluição sonora repercute desfavoravelmente no potencial cognitivo que é próprio da infância. Estudos feitos em diversos países demonstram que um grande percentual das unidades escolares está localizado em pontos urbanos com elevada agressão sonora do tráfego. Constatam também que os altos índices de déficit de atenção e aprendizagem são mais frequentes na população infantil exposta a esse agente poluidor. Com efeito, o desempenho escolar é prejudicado quando a fala do professor é ininteligível em virtude da poluição sonora na sala de aula.

Em síntese, não faltam provas de que saúde é requisito prioritário para a boa educação sem a qual não haverá saúde. São os dois pilares indissociáveis de uma sociedade saudável que requer a despoluição ambiental para garantir o bem-estar físico, mental e social de todos os seres humanos. Se o meio ambiente não for despoluído, saúde e educação de qualidade serão inviáveis.

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Publicado originalmente no Correio Braziliense em 11/03/2019

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