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OPINIÃO

Graduação em Ciências Contábeis e em Ciências Econômicas, mestrado em Administração pela UnB e especialização em Administração Econômica e Financeira pela Universidade de Paris I e em Política e Administração Tributária pela Fundação Getúlio Vargas (FGV). Professor do Departamento de Ciências Contábeis e Atuariais da Universidade de Brasília (UnB). Consultor legislativo e coordenador do Núcleo de Orçamento, Finanças e Tributação, da Câmara dos Deputados. Possui cinco livros publicados, entre eles Contabilidade Tributária (Atlas) e O sistema Tributário na Nova Constituição (Editora UnB).

Roberto Bocaccio Piscitelli

 

A divulgação do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) calculado pelo PNUD (ONU) de 2019, há poucos dias, suscitou diversos comentários pela imprensa e especialistas. Esse índice, como se sabe, introduzido a partir dos anos 90, ampliou significativamente a dimensão do conceito de bem-estar, de qualidade de vida das populações, antes referenciado exclusivamente à renda, embora muitos autores ainda o considerem insuficiente.

 

O IDH resulta de uma combinação de vários indicadores, com os seus respectivos pesos: educação – alfabetização e taxa de matrículas –, esperança de vida ao nascer e renda per capita; o resultado situa-se de zero a 1. Os últimos dados apurados são relativos a 2018 e listaram 189 países. Nesse ranking, o Brasil perdeu uma posição, da 78ª para a 79ª, embora tenha ganhado 0,001 ponto percentual, com a contagem de 0,761, o que o faz alcançar a classificação de país de “alto” grau de desenvolvimento (abaixo do grupo dos países de “muito alto” grau de desenvolvimento).

 

Tivemos uma estagnação em educação – que seria uma pré-condição do processo de desenvolvimento. Mas a pior situação diz respeito à péssima distribuição de renda, só superada pelo Catar, e não dá sinais de melhoria. Basta dizer que 1% da nossa população detém 28,3% da renda total (29% no Catar) e 10%, 41,9%.

 

A nossa sociedade reflete fielmente essas distorções através de seus diferentes estratos, haja vista, por exemplo, a renda das mulheres corresponder a 42% menos que a dos homens, mesmo se sabendo que seu nível educacional é superior ao deles e da importância que esse fator deveria ter para diferençar os respectivos níveis de remuneração. (Há que se levar em conta a influência que deve exercer a natureza dos cargos e funções disponíveis para uns e para outros nas organizações.)

 

Constatou-se também que o Brasil é o país que mais perde posições quando o valor é ajustado à desigualdade das três variáveis: o índice cairia para 0,574 (menos 24,57%), na 102ª posição. Se a renda cresce pouco e isso trava a situação presente, a estagnação na educação é ainda mais grave, à medida que compromete o futuro. (Veja-se que não estamos discutindo aspectos tais como a qualidade da educação.)            

  

Na América do Sul, três países apresentam situação melhor que a nossa: Chile, Argentina e Uruguai ocupam respectivamente as 42ª, 48ª e 57ª posições. Noruega, Suíça, Irlanda e Alemanha ocupam as primeiras posições.

 

O problema das desigualdades de renda – e as de riqueza são ainda maiores – tem origem colonial (e não se deve ignorar o fato de que nosso País foi o último a abolir – formalmente – a escravatura). Estamos convencidos de que a principal e mais urgente das reformas teria sido a tributária, de caráter efetivamente progressivo, como um antídoto às abissais diferenças de renda, como um mecanismo que, mesmo que a longo prazo, pudesse levar a uma maior equalização da renda pessoal disponível e das distorções regionais e setoriais.

 

Não é possível dizer que um país com a concentração de renda do Brasil seja democrático. Só relações muito desiguais de poder foram capazes de produzir por tanto tempo uma estrutura tão injusta como a nossa.                                            

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