OPINIÃO

José Roberto Vieira é coordenador da Coordenação de Apoio às Pessoas com Necessidades Especiais da UnB, graduado em Serviço Social pela mesma Universidade e especialista em Gestão Educacional. É cadeirante em consequência de poliomielite contraída aos nove meses de idade.

José Roberto Vieira

 

A questão da deficiência tem sofrido mudanças na sua percepção e tratamento de modo que não seja mais admissível aceitar a segregação das pessoas que vivenciam a experiência de se viver em um corpo onde as limitações são impostas pela sociedade.

 

Até a década de 1960, a deficiência era definida pelo modelo biomédico. Este modelo reduzia a deficiência ao corpo do indivíduo. Ela era tratada como um problema de saúde, devendo ter ações voltadas para sua prevenção, tratamento e reabilitação, que tinha por objetivo a cura. As pessoas com deficiência teriam que se adequar a uma sociedade que ditava os padrões de normalidade para seus membros. Os que não se enquadravam nesse padrão eram considerados anormais.

 

Um marco que modificou a compreensão sobre deficiência pode ser considerado a carta que Paul Hunt, sociólogo com deficiência física, enviou para o jornal inglês The Guardian, em setembro de 1972. Nela, Hunt abordava a questão do isolamento físico e intelectual, no qual as pessoas deficientes estavam acometidas e, principalmente, propunha a formação de um grupo que desse voz às reivindicações dessas pessoas. A discussão sobre o assunto ganhou outro sentido quando os próprios deficientes reivindicaram a palavra para falar deles mesmos.

 

A partir daí, buscou-se retirar a deficiência do corpo e colocá-la na sociedade. Deficiência não seria uma questão médica, não era por se viver em um corpo com impedimentos que uma pessoa era deficiente. A desvantagem só poderia ser percebida se o ambiente, no qual a pessoa com algum tipo de impedimento, não permitisse sua interação com a sociedade.

 

Nesse sentindo, surge a definição de deficiência pelo modelo social, que não tratava a questão como um problema de saúde de quem vivência a experiência da deficiência. O tratamento não tinha que ser voltado para os corpos com impedimentos, mas sim nos espaços sociais que não estavam adequados para dar igualdade de oportunidade para todos. A deficiência não era a causa da segregação de quem a vivencia, mas sim o modo como a sociedade não está preparada para incluir esse grupo.

 

Quando a deficiência deixou de ser um tema exclusivo da visão biomédica, se tornando uma das expressões da questão social, houve um ganho para as pessoas que habitam um corpo com impedimento. O que antes era visto como uma tragédia pessoal se tornou uma questão de justiça, uma vez que a deficiência só é percebida quando há falta de condições de igualdade para que essas pessoas possam interagir com a sociedade, é colocada a sua frente.

 

A discussão, iniciada nos anos de 1960, culminou em 2007, com a realização da Convenção Internacional Sobre os Direitos da Pessoa com Deficiência, que gerou um documento ratificado pelo Brasil no ano de 2009. Em seu preâmbulo a Convenção reconhece a deficiência como um conceito em evolução e que esta situação é o resultado da interação entre pessoas com deficiência e as barreiras atitudinais e ambientais que impedem a plena e efetiva participação na sociedade em igualdade de condições com os demais individuo.

 

Em 2015 entrou em vigor no Brasil a Lei Brasileira de Inclusão, uma das mais modernas do mundo para a promoção da igualdade das pessoas com deficiência na sociedade. O desafio é fazer com que essa lei não seja apenas cumprida, mas, sim, compreendida para que não vira mais uma lei no já extenso arcabouço jurídico brasileiro. Assim o Dia internacional da Pessoa com Deficiência (3/12) será um dia para ser comemorado e não um momento de luta.

 

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