OPINIÃO

Wanderson Flor do Nascimento é professor do Departamento de Filosofia da Universidade de Brasília. Graduado e Mestre em Filosofia e Doutor em Bioética. Atua também nos programas de Pós-Graduação em Bioética e Metafísica.

Wanderson Flor do Nascimento

 

Vinte de novembro é celebrado como o Dia Nacional da Consciência Negra. Até o final do século XX, a data oficial do Estado para a recordação da luta do povo negro era o Treze de Maio, comemorado, então, como o dia da libertação da escravatura. Convencidos de que a Lei Áurea foi um movimento muitíssimo menos impactante para a luta contra o racismo que a existência do Quilombo dos Palmares, os movimentos negros propõem que a data do assassinato de Zumbi em 1695, em luta pela liberdade, seja então a nova data comemorativa da busca da libertação do povo negro e do enfrentamento ao racismo.

 

O Quilombo dos Palmares foi não apenas uma organização de resistência ao processo de escravização colonial, como também foi uma recriação brasileira de uma instituição já existente no continente africano, em regiões de línguas bantas. O Quilombo era também um movimento de reconstrução das identidades estilhaçadas, seja aqui, seja no Velho Continente Negro. Esta é uma reconstrução acolhedora, criativa e guerreira. Parte daquilo que conhecemos como cultura negra vem da ideia de quilombo e, por isso, a cultura negra é, necessariamente, uma cultura de resistência e criação.

 

Uma importante historiadora negra do século passado, Beatriz Nascimento, que estudou o Quilombo tal como ele existia em Angola, no continente africano, nos contava que esta instituição não era apenas um coletivo organizado. Quilombo era também cada uma das pessoas que tornassem a sua vida uma marca de resistência.

 

Mesmo tendo findado a escravidão formal, o racismo que a constituiu segue firme e forte na sociedade brasileira, embora insista em se ocultar. De sul a norte de nosso país, ter a pele escura, os cabelos crespos ou qualquer outra característica que lembre a origem africana é fator para se colocar na mira de ataques simbólicos e físicos contra a humanidade de quem tiver esses traços.

 

Ainda hoje a juventude negra é a que mais morre. A trabalhadora e o trabalhador negra/o é o que ganha menos. Os trabalhos subalternizados ou com pouco prestígio são, majoritariamente, ocupados por pessoas negras. A maior parte das pessoas analfabetas no país é negra. O racismo em nosso país é forte e eficiente em colocar em posições mais vulnerabilizadas as pessoas negras.

 

As religiões de matrizes africanas, originalmente negras, são os alvos mais contundentes dos ataques de racismo religioso, que se traveste de intolerância religiosa.

 

Por tudo isso, a necessidade da luta antirracista prossegue imperativa. É uma tarefa não apenas para as pessoas negras, mas para todas as pessoas que pretendam viver em uma sociedade não opressora. O enfrentamento ao racismo é tarefa de cada uma e cada um de nós, que nos ocupemos da construção de uma sociedade melhor.

 

Escolher o dia 20 de novembro como Dia da Consciência Negra é um conclame para que todas e todos sejamos novamente um quilombo, na certeza de que enegrecer a consciência é buscar um mundo sem racismo, menos desigual, mais democrático, mais acolhedor para as pessoas em sua diversidade.

 

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