OPINIÃO

Pio Penna Filho é professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília. Graduado em História, pela Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), mestre em História e doutor em História das Relações Internacionais, ambos pela UnB. Atua nas áreas de História, Relações Internacionais e Segurança Internacional, nos temas: em América Latina e África. 

Pio Penna Filho

 

Estados Unidos, Rússia, China, Alemanha, França e Inglaterra são os maiores vendedores de armas do mundo. Armamento e munição produzido por esses países estão a serviço da destruição e da morte, em praticamente todos os conflitos e guerras espalhados pelo mundo. Eles são os mercadores da morte.

 

Esses países, entre outros, é claro, lucram com a desgraça alheia. À parte Rússia e China, que, como sabemos, não estão assim tão interessados em direitos humanos e democracia, os outros quatro aqui citados, curiosamente, se colocam como paladinos justamente desses valores (direitos humanos e democracia), o que simplesmente é incompatível com a sua política 'pragmática' de vender ou fornecer armas que alimentam conflitos alhures.

 

O que os governos desses países costumam chamar de política comercial pragmática nós podemos chamar de hipocrisia. E trata-se de uma hipocrisia que custa a vida de milhares e milhares de pessoas todos os anos.

 

Observem que eles gostam muito de falar em não proliferação nuclear, adoram falar contra as munições cluster (bombas de fragmentação), amam pregar que é preciso estabelecer regimes internacionais voltados para o desarmamento e condenam Estados que possuem armas químicas e biológicas.

 

Enquanto essa lenga-lenga é proferida em todas as direções, inclusive com o envolvimento de muitos acadêmicos desses países que organizam eventos para discutir a não proliferação nuclear, o fato é que na prática eles vendem as armas que são usadas nos conflitos reais, e não naqueles que um dia poderiam vir a acontecer. É uma hipocrisia completa.

 

 

Outra curiosidade: Estados Unidos (31%) e Rússia (27%) são responsáveis por 58% das vendas de armas no mundo. O terceiro país no ranking é a China, responsável por cerca de 5% das vendas. Depois vem os países europeus, que nesses dados são confortavelmente individualizados.

 

Nas estatísticas preparadas por instituições de pesquisa europeias ou norte-americanas eles figuram da seguinte forma: Alemanha, 5%, França, 5%, Inglaterra, 4%, Espanha, 3%, Itália, 3%. Ora, são todos membros da União Europeia e representantes do que eles mesmos chamam de mundo 'civilizado' e comprometido com a boa e correta política. Entretanto, de novo prevalece a hipocrisia. Quando os colocamos no bloco europeu eles são responsáveis por 20% do comércio mundial de armas. Isso não é pouca coisa.

 

Se somarmos esses 20% aos 31% da parcela de venda de armas que cabe aos Estados Unidos, temos que 51% do comércio de armas está concentrado nesses países ditos 'ocidentais'. Todos 'comprometidos' com a democracia e com os direitos humanos! Quando incluímos a Rússia nessa conta, temos que 78% das vendas de armas pertencem a esses países.

 

É importante refletirmos sobre esses números porque o comércio internacional de armas é responsável por movimentar anualmente bilhões de dólares e também responsável por uma quantidade praticamente incalculável de mortes violentas. Portanto, eles têm culpa por esses estado de coisas e são, no mínimo, corresponsáveis por sistemáticas violações aos direitos humanos ao redor do mundo. É preciso, caro leitor, ficar atento com a conversa mole dessa gente, que prega uma coisa e pratica outra.

 

Artigo publicado originalmente na A Gazeta - MT em 9/9/2016

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