OPINIÃO

João Cláudio Todorov é professor Emérito e Pesquisador Associado da Universidade de Brasília. Foi reitor, vice-reitor e decano de Pesquisa e Pós-Graduação. Graduado em Bacharelado e em Licenciatura em Psicologia pela Universidade de São Paulo, doutor em Psicologia pela Arizona State University, ASU/Estados Unidos. Recebeu os prêmios Disseminação Internacional da Análise do Comportamento, da Association for Behavior Analysis International e pelo conjunto da obra, da Federação Ibero-Americana de Associações de Psicologia. É membro honorário dos Conselhos da Sociedade Brasileira de Psicologia e da Associação Brasileira de Psicologia e Medicina Comportamental. Foi eleito Fellow da Association for Behavior Analysis International. Atua no tema análise de Políticas Sociais, nas áreas de transferência condicionada de renda, educação, medidas socioeducativas, meio ambiente, mobilidade urbana e direitos de crianças e adolescentes.

João Cláudio Todorov



Elogiado por todos os que trabalharam com ele, dos colegas aos alunos, passando por servidores dos órgãos que dirigiu, Lauro Mohry cativava por sua presença serena e acolhedora, sempre bem-humorado e confiante dos rumos a tomar. Nunca foi meu chefe, mas vejo no depoimento dos que tiveram essa experiência o resultado da boa relação vivida. Meus contatos com ele foram vários e diferentes. Em 1963 votei nele quando fez parte da chapa de José Serra na eleição para a presidência da UNE. Não nos conhecíamos então, mas o passado comum de participação na política estudantil sempre reaproxima as pessoas. Começamos a conviver quando o Laboratório de Analise Experimental do Comportamento mudou do prédio SG-12 para o Minhocão, mas já estávamos outra vez juntos em um movimento de política universitária desde a assembleia de fundação da ADUnB em 1978. Acabamos virando uma espécie de compadres acadêmicos quando o primeiro bolsista de iniciação científica do Lauro, o Marcelo Valle, se casou com uma de minhas melhores alunas de iniciação científica, Elenice Hanna.
    
Perseverança


Sua história com o vestibular da UnB começou cedo, logo que chegou para trabalhar no Instituto de Química. De comissões ad hoc nomeadas para cada vestibular, como em 1965, ano em que o Prof. Romeu de Moraes Almeida veio de São Paulo para ser seu coordenador, a UnB passou a contar com uma Comissão Permanente do Vestibular desde 1970, na administração do Reitor Amadeu Cury. Lauro trabalhou na COPEVE desde o início, como sempre levando o trabalho muito a sério, de tal forma que quando participou da campanha que elegeu Cristovam Buarque reitor já tinha pronta a sugestão de uma diretoria, que acabou criada dentro da estrutura do Decanato de Ensino de Graduação. A antiga comissão permanente virou Diretoria de Acesso ao Ensino Superior (DAE), dirigida por Lauro Mohry.


Cristovam assumiu a reitoria em 15 de agosto de 1985, eu fui eleito a seguir e assumi a vice-reitoria em 15 de novembro. A equipe já estava formada e trabalhando e ao vice-reitor coube auxiliar o reitor nos colegiados acadêmicos e presidir as sessões do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão. Interessados em pesquisar a história de alguns dos sucessos de Lauro Mohry ganharão com a consulta às atas do CEPE desde 1985. Descobriu-se que o responsável direto pelo vestibular da UnB era contra esse vestibular como existia. Era tão contra que preferiria escolher os alunos pela consulta de suas notas no Ensino Médio. Perdi a conta de quantas vezes essa ideia e sucedâneas foram discutidas e rejeitadas pelo CEPE, transbordando para outros colegiados, para institutos e faculdades. Nos dez anos seguintes a persistência do Lauro levou a desenvolvimentos que mudaram não só a UnB, mas o pais também – ENEM, PAS, sistema de quotas.

Vestibular da UnB


Quando fui eleito reitor em junho de 1993 decidimos usar os meses que tínhamos até a posse em novembro para fazer o planejamento estratégico da gestão. Coordenado pelo Prof. Guilherme Vivacqua, do então Departamento de Administração, o processo de transformação do programa de campanha em plano de ação envolveu mais de 300 professores e mais de 400 servidores técnico-administrativos. Um dos projetos apresentados pelo Lauro Morhy foi o de transformar a DEA em um centro ligado diretamente à reitoria, com autonomia financeira, que continuasse responsável pelo vestibular da UnB, mas que também atuasse no resto do ano no mercado de vestibulares e concursos. O projeto recebeu aprovação tão geral que todos os documentos necessários à criação do CESPE – Centro de Seleção e Promoção de Eventos – estavam prontos quando assumi a reitoria. A agilidade para captação e gestão de recursos foi essencial para o sucesso do novo centro; um sucesso tão grande que recentemente o CESPE foi "promovido’’ para fora da UnB, em "desapropriação’’ feita pelo Governo Federal. A estrutura que começou como Comissão Permanente há mais de quarenta anos tem uma dinâmica interna tão forte que a faz resistir e crescer mesmo com mudanças radicais na organização em que se insere.

 
PAS


O Programa de Avaliação Seriada foi objeto de uma parceria entre a UnB quando eu era reitor, e o Governo do Distrito Federal, quando meu amigo e colega ex-reitor Cristovam Buarque era governador do Distrito Federal. A comissão mista UnB-GDF para estudar as condições para o desenvolvimento de um programa de avaliação seriada nos moldes da sugestão do Lauro Morhy foi criada por ato do reitor em ----- de ---- de 1995. A primeira constatação da comissão formada por professores do GDF, da rede privada, e da UnB, foi a de que o ensino médio em Brasília era um caos. Nem na rede pública os currículos eram os mesmos. A confusão era tão grande que decidiu-se adiar em um ano a implantação do programa até que a Secretaria de Educação do GDF, comandada pelo ex-reitor Antonio Ibañez, sincronizasse currículos e sua execução em toda a rede. A comissão mista funcionou com recursos da UnB gerados pelo CESPE, o que talvez seja responsável por algumas notícias que mencionam o CESPE como responsável pelo PAS. Não foi. O PAS foi um processo de longa maturação, iniciado pela sugestão de Lauro Morhy e acompanhado sempre por ele, mesmo quando já não tinha ligação direta com o vestibular por ser nomeado Decano de Pesquisa e Pós-graduação em novembro de 1993.
    
Avaliação.


Logo depois do carnaval de 1996 o Ministro Paulo Renato conversou informalmente com alguns reitores sobre um projeto que se lhe veio quando caminhava solitário na praia durante os feriados. A questão da avaliação e seleção de alunos já era nacional, havia sido liderada de início na UnB por Lauro Morhy e pela Professora Isaura Beloni, da Faculdade de Educação, mas rapidamente foi difundida pelas associações, sindicatos e partidos. Pois Paulo Renato teve uma epifania na praia – uma só prova, nacional, do MEC, para selecionar os alunos, sem as características criticadas nos vestibulares das universidades, e com todos os requisitos recomendados pelos especialistas em avaliação. Rapidamente chamado de Provão, aproveitado pela UNE para gerar o slogan O Provão não Prova Nada, o que o ministro ganhou no carnaval de 1996 virou o ENEM - Exame Nacional do Ensino Médio.

Futuro


Lauro foi um daqueles homens indispensáveis para o futuro de qualquer grupo. Pesquisador renomado, ativista na política científica, preocupado com as questões nacionais, e um modelo para o professor universitário: professor, pesquisador, administrador, visionário.

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