OPINIÃO

Carolina Pescatori, Maribel Aliaga e Paola Ferrari são coordenadoras do Eixo Paisagem e Paisagismo da equipe de elaboração do Plano Diretor do Campus Darcy Ribeiro.

Carolina Pescatori, Maribel Aliaga e Paola Ferrari

 

A UnB está vivendo um momento muito importante para seu futuro: a revisão do Plano Diretor do Campus Darcy Ribeiro. A proposta irá estabelecer as diretrizes para a ocupação dos espaços do campus, tanto das áreas já construídas quanto das áreas de preservação, bem como, futuras expansões. Assim como qualquer cidade, a cidade da universidade precisa pensar continuamente seu espaço, sua ocupação e seu uso. Procurando equilíbrio entre a preservação do seu patrimônio cultural moderno, de valor reconhecido nacional e internacionalmente, se adequando aos enormes desafios impostos pela crise ambiental, ao crescimento e às demandas da população universitária.

 

A história da construção do Campus Darcy Ribeiro se confunde com a de Brasília, tanto nas propostas de projeto como no desejo de modernidade dos anos 1950/60. Seu desenho, projeto inicial de Lucio Costa, seguia os princípios do urbanismo moderno com edifícios isolados e vias de acesso prioritariamente rodoviário. Assim como a capital, é delineado por estradas curvas e rápidas que permitem os acessos e definem as escalas internas, conformando uma cidade dentro da cidade. Porém, a universidade não se restringe apenas ao seu perímetro delimitado em projeto. Ela funciona como um amplo e aberto parque urbano, que propõe uma articulação com a Asa Norte, pelas ramificações e caminhos de conexão com a L3 e L2, servindo de transição com a cidade na sua escala residencial. A paisagem do campus Darcy Ribeiro, é marcada pela prevalência dos espaços abertos livres, com grandes áreas verdes permeando os edifícios e formando um verdadeiro parque onde a paisagem, em virtude da topografia, se abre em visuais para o lago Paranoá. A separação dos fluxos de veículos motorizados e pedestres permite que estes transitem em experiências sensoriais muito diferentes, não apenas pela velocidade, mas pelas espacialidades percorridas. O conjunto, especialmente na área histórica do campus, forma uma paisagem urbana bastante articulada com a escala bucólica de Brasília, estabelecendo relações cotidianas com a cidade e a população que extrapolam o mero uso institucional.

 

O projeto inicial era ambicioso e previa que, iniciando as obras em 1962, a universidade poderia receber em três anos os primeiros 1.500 alunos e, a partir disso, receber dois mil novos alunos a cada ano, até completar dez mil alunos em 1970. Ou seja, a construção da universidade estava em perfeita sintonia com a construção do país: 50 anos em 5. Porém, nestes 62 anos a universidade cresceu, se transformou, hoje a UnB tem mais de 55 mil pessoas (DPO-UnB, 2022). Este crescimento desejado, planejado e necessário precisa de diretrizes de projeto que entendam estes novos usuários que vem de todo o distrito federal, e ainda incorporem na sua paisagem as noções de sustentabilidade, inclusão e equidade.

 

Apesar da clara predominância desses princípios e do seu enorme potencial social e paisagístico, existem limitações e desafios a serem vencidos. A relação do campus com as superquadras, de onde vêm parte importante dos fluxos de pedestres e onde a cidade ‘acontece’, é frágil, pouco generosa e implica em percursos muitas vezes arriscados, especialmente para os corpos mais vulneráveis. Por sua vez, a relação do campus com o lago Paranoá, um recurso paisagístico e ambiental extremamente valioso, também pode ser melhorada e ampliada. As áreas remanescentes de cerrado estão sofrendo processos de degradação e precisam de estratégias de conservação, viabilizando, assim, sua preservação e reconhecimento social.

 

A configuração da expansão do campus ao norte e ao sul se fez sem qualidades estruturais de conexão física e simbólica, gerando espaços segregados e desarticulados entre si. Pode-se argumentar que o campus se expandiu por meio de um “urbanismo para o automóvel”. Esta forma de urbanizar privilegia espaços e infraestruturas dedicadas aos carros e seus usuários: estacionamentos gigantescos; edifícios ilhados em estacionamentos; ruas sempre bem pavimentadas e iluminadas, enquanto as calçadas são estreitas, desprotegidas da insolação e/ou mal iluminadas, muitas vezes com pavimentação inadequada e com percursos desconectados das linhas de desejo, que não conformam as necessárias costuras urbanas entre edifícios (tão características da área histórica do campus).

 

Todas essas questões fazem parte da paisagem do campus Darcy Ribeiro. Ademais, também precisamos pensar nos novos usos que a população do campus tanto necessita, como a habitação estudantil, apoio fundamental às políticas de democratização da universidade pública. Temos um grande desafio pela frente, mas acreditamos que o Plano Diretor, construído por meio do debate com a comunidade universitária, colocando seus saberes em prática, pode nos levar a um campus mais sustentável ambientalmente, socialmente integrador e que preserve o espaço público como lócus da vivência diversa, acolhedora e democrática de que tanto precisamos.

 

Acompanhe o desenvolvimento dos trabalhos no Instagram, criado na disciplina da FAU - Ateliê de Projeto de Arquitetura e Urbanismo Sustentável: @paisagem_darcy  

 

___________________________
Saiba mais sobre o Plano Diretor do Campus Darcy Ribeiro e participe da consulta pública.

 

 

 

 

ATENÇÃO – O conteúdo dos artigos é de responsabilidade do autor, expressa sua opinião sobre assuntos atuais e não representa a visão da Universidade de Brasília. As informações, as fotos e os textos podem ser usados e reproduzidos, integral ou parcialmente, desde que a fonte seja devidamente citada e que não haja alteração de sentido em seu conteúdo.