OPINIÃO

 

Maria Emília Machado Telles Walter é decana de Pesquisa e Inovação e coordenadora local da 74ª Reunião Anual da SBPC.

Maria Emília Walter

 

Neste ano em que comemora seus 60 anos, a UnB é a instituição organizadora da 74ª reunião anual da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência. Com o tema Ciência, Independência e Soberania Nacional, essa reunião é essencial em um ano de eleições presidenciais, estaduais e no DF, no qual debatemos o modelo do país que queremos.


A reunião anual da SBPC é um marco brasileiro, o maior evento científico da América Latina, e nesta edição além do bicentenário da independência, celebra ainda o centenário de Darcy Ribeiro e o centenário da Semana de Arte Moderna de 1922.


A participação da comunidade neste evento permite que ela conheça e valorize o papel relevante das instituições de ciência e tecnologia e suas contribuições para a sociedade. Neste ano, a programação científica foi composta por dezenas de atividades, desenvolvidas em conferências, painéis e mesas-redondas. Exposições variadas estimularam reflexões sobre o bicentenário da independência, leitura de biografias de cientistas e visitas a estandes da ExpoT&C apresentaram produtos inovadores de empresas e instituições ligadas à C&T. A SBPC Jovem e a SBPC vai à Escola tiveram a participação de centenas de alunos e professores das escolas públicas do ensino básico do DF nos quatro campi da UnB, possibilitando a vivência de formas diferentes do fazer científico. A SBPC Afro e Indígena trouxe debates importantes sobre questões raciais e dos nossos povos originários, que precisam ser enfrentadas. Por fim, a SBPC Cultural permitiu integrar e valorizar a arte e a cultura, que tanto nos marcam e caracterizam como país.


Foram intensamente explorados problemas importantes para o mundo e para o Brasil, como as consequências da pandemia de covid-19. A tragédia, com a perda de milhares de vidas, não foi maior graças ao trabalho das nossas instituições públicas de ciência e tecnologia, além é claro, do SUS. Também foram debatidos diversos temas, como segurança das urnas eletrônicas, fake news, mudanças climáticas, devastação do meio ambiente, aprofundamento da pobreza e aumento das desigualdades sociais. Ações de enfrentamento propostas com o suporte da C&T certamente ajudarão a mitigar esses problemas.


No Brasil, a pesquisa é majoritariamente desenvolvida nas nossas instituições públicas, universidades e institutos de pesquisa, mantidas pelo governo. Isso impõe a necessidade urgente de que as políticas de C&T sejam de Estado, para que não variem de acordo com ideologias de governos, tema também foi debatido nesta SBPC.  


Por outro lado, muito vem sendo falado, no país, sobretudo no governo atual, sobre inovação. De fato, não se pode falar em inovação sem produção de conhecimento nas instituições de ensino e pesquisa, que passa pela formação de pessoas, com excelência, na graduação e na pós-graduação. Lembro que inovação é formada por eixos, quais sejam, academia, governo e setor privado, além das tecnologias sociais e do meio ambiente. No entanto, cortes sucessivos de recursos nos últimos anos vêm quebrando o Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia (SNCT), que tem sido construído desde as décadas de 1950 e 1960, sobretudo, esses cortes vêm afetando fortemente as agências de fomento tradicionais no Brasil – Capes, CNPq e Finep. Deixar de aportar recursos à academia e ao SNCT, para produção do conhecimento, significa tirar um dos eixos da inovação, indica uma falta de visão estratégica do que vem acontecendo no mundo, no século XXI, e afeta profundamente o desenvolvimento e o futuro do país.


É muito simbólico que a UnB seja a instituição organizadora neste ano, com base na história da nossa instituição que, desde sua criação, em 21 de abril de 1962, luta pela ciência, tecnologia e inovação, pelo ensino público e inclusivo. A reunião anual possibilitou mostrar que a comunidade científica brasileira e, particularmente, da UnB, vem resistindo ao desmonte do país, com seu trabalho cotidiano, tendo como premissa que a luta pela ciência permite esperançar a consolidação da nossa independência e soberania, com democracia e justiça social.

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