OPINIÃO

Lucio Remuzat Rennó Junior é professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília e ocupa a Direção do Instituto de Ciência Política para o mandato de 2020 a 2024. Tem experiência na área de Ciência Política, com ênfase em Política Comparada, Estudos Legislativos e Comportamento Eleitoral.

Lucio Rennó

 

No último dia 27 de outubro, a Câmara do Deputados aprovou o nome de seu representante no Conselho Nacional de Justiça. Apoiado por 12 partidos de centro, esquerda e direita, foi indicado o advogado Mário Maia, que tem como principal atributo curricular a paternidade de Napoleão Nunes Maia, ministro do STJ. Este, por sua vez, se empenhou pessoalmente, sem qualquer pudor, para a vitória do filho. De início, não podemos considerar normal que membros das mais elevadas cortes do país façam pressão pessoal para alavancar a carreira de seus parentes próximos enquanto condenam outros por nepotismo cruzado. Em não sendo suficiente, Mário Maia derrotou candidatos qualificados e experientes, como a Professora da Faculdade de Direito da Universidade de Brasília, Janaina Penalva, com experiência profissional no próprio CNJ, e César Wolff, com atuação na OAB em Santa Catarina e professor universitário. A escolha, claramente, não foi baseada no mérito ou no interesse público. Foi baseada principalmente no pedido do ministro e, provavelmente, em uma ampla campanha de convencimento dos Deputados.

 

Para além do óbvio absurdo, o incidente explicita padrões de atuação da Casa que merecem mais debate público e aponta para a dificuldade de partidos entenderem as implicações de decisões em cenários com menos escrutínio. Quando ninguém está olhando, aprova-se qualquer coisa?

 

O fato deixa claro que a Câmara se mostra maleável à influência de partes interessadas quando o assunto é considerado interno ou de baixa relevância nacional, com pouca visibilidade pública. Se ocorreu no caso de um juiz, pensem nos vários outros assuntos que recebem pouco escrutínio, mas tem implicações para setores econômicos poderosos da nossa sociedade. Na ausência de supervisão e cobrança, aumenta a amplitude para deputados exercem discricionariedade. Contudo, é importante destacar que TUDO que se faz na Câmara é de interesse público e parlamentares devem SEMPRE ser constrangidos a atuarem não em proveito próprio ou em benefício privado, mas para o bem público. Quando decidem escolher um filho de juiz para ser seu representante no CNJ, cometem erros preocupantes para o interesse coletivo.

 

O principal é justamente apontar alguém muito próximo ao judiciário, com fortes laços pessoais, para fiscalizar o próprio Poder Judiciário em nome do Poder Legislativo. O CNJ é composto por 15 membros, sendo a maioria representante de órgãos do próprio Poder Judiciário – um absurdo. Apenas dois, o que já é bastante conveniente para juízes, são cidadãos de notável saber jurídico e reputação ilibada, apontados pela Câmara dos Deputados e pelo Senado. Deveriam ser de fora: representantes da sociedade. Um desses, agora, será um filho de juiz com redes próprias e do pai no Judiciário.

 

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Publicado originalmente no Estadão on-line SP em 04/11/2020

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