OPINIÃO

Pio Penna Filho é professor do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de Brasília. Graduado em História, pela Universidade Federal de Ouro Preto (Ufop), mestre em História e doutor em História das Relações Internacionais, ambos pela UnB. Atua nas áreas de História, Relações Internacionais e Segurança Internacional, nos temas: em América Latina e África. 

Pio Penna Filho

 

Para chegar aos portos do norte da África que servem como portas de saída do continente africano em direção à Europa, milhares de africanos tem que atravessar o perigoso deserto do Saara. Muitos morrem nessa longa e crítica travessia. Na cabeça de cada migrante, a esperança de um futuro melhor, mesmo que isso possa lhe custar a vida. 

 

Atravessar um deserto a pé, ou mesmo em veículos comuns, não é tarefa das mais fáceis. As severas condições do deserto por si só se constituem numa barreira difícil de transpor. Mas para milhares de africanos vale a pena tentar.

 

Isso é uma prova cabal do quão difícil são as condições de sobrevivência para essa gente em seus próprios países de origem. Ninguém em sã consciência arriscaria a vida dessa forma se não estivesse quase sem esperança de ter a vida melhorada no curto ou no médio prazo.

 

Os mortos da rota da Saara acabam esquecidos no deserto. Seus corpos seguem abandonados até se desintegrarem. Na verdade, poucas pessoas se preocupam com o destino dessa gente desafortunada.

 

Embora o objetivo final seja alcançar a Europa, o Saara não é o único obstáculo para os migrantes africanos. Muitos deles costumam atravessar vários países antes de adentrarem no deserto propriamente dito. Uma das rotas mais conhecidas atravessa o Níger até chegar ao sul da Líbia. De lá até o litoral ainda restam centenas de quilômetros a serem percorridos.

 

No caminho, não bastassem as dificuldades naturais, os migrantes ainda enfrentam o pesadelo das gangues armadas que controlam partes de um país fragmentado, sem governo efetivo, que é a realidade da Líbia pós Kadafi. Muitos são capturados e vendidos em mercados de escravos ou se tornam reféns para escusas e tenebrosas negociações com autoridades europeias que não os querem em seu continente.

 

Essa é a triste realidade dos que querem chegar ao continente europeu pela rota do Saara. Uma rota ainda mais perigosa que aquela usada por latino-americanos para alcançar os Estados Unidos atravessando territórios inóspitos no norte do México. Aliás, os desafios de ambas as rotas são muito semelhantes, mas o grau de dificuldade do Saara é ainda maior.

 

Há muito pouca humanidade com relação a essas pessoas. Os riscos e dificuldades naturais enfrentados pelos migrantes são acrescidos por outros que são impostos por autoridades que, ao invés de se preocuparem com as suas vidas, se preocupam em primeiro lugar com a segurança dos Estados ou da própria autoridade.

 

O fluxo de pessoas do Sul para o Norte é reflexo das duras condições impostas a milhões e milhões de pessoas que, sem esperança de um futuro melhor em seus locais de origem, se arriscam e morrem por um futuro que é muito mais duvidoso do que efetivamente promissor.

 

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Publicado originalmente na Gazeta Digital - MT em 02/06/2017

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